quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Livre contrabando

Num período multicrises, com recessão escancarada, déficit público gigantesco e aumento de impostos prestes a desabar no bolso dos brasileiros, uma notícia divulgada pela Folha de S. Paulo dá vontade de morder o céu da boca. Pelo menos, R$ 10 bilhões é o quanto o governo federal deixou de arrecadar, só entre os anos de 2011 e 2014, por não ter bloqueado a entrada de produtos contrabandeados no Brasil. Tal quantia corresponde a 1/3 do montante apontado como rombo no Orçamento da União de 2016. Ou 1/3 do que a equipe econômica governamental deseja abocanhar com a recriação da odiada CPMF.

O dinheiro que o governo deixou ir pelo ralo foi apontado em estudo inédito do Idesf (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras). Mostra o impacto da chamada Operação Ágata. Coordenada pelo Ministério da Defesa, é a principal medida para o fechamento de fronteira. Quando é realizada, faz crescer bastante o que se recolhe de II (Imposto de Importação) e de IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados). A participação deles na receita tributária total sobe, em média, 15% e 10%, respectivamente. O levantamento considera apenas estes dois tributos, embora a entrada de contrabando tenha efeito sobre outros. 

Em média anual, o IPI responde por 12,75% do bolo tributário arrecadado pela União. Em 2011, após a segunda Operação Ágata, o imposto chegou a representar 16% da receita tributária federal. Comportamento semelhante é verificado com o II. Nos meses em que a medida foi implementada, a participação do tributo na receita federal subiu para, em média, 9,6%, contra os 8,3% registrados no ano. O trabalho apurou que o País amarga perda anual de cerca de R$ 3 bilhões sem as blitze nas fronteiras.

Nas palavras de Luciano Barros, presidente do Idesf, “quando acontece a Ágata, o traficante entra de férias". Ou seja, se a operação ocorrer de forma contínua ou, pelo menos, constante serão estabelecidos os obstáculos necessários para inviabilizar o contrabando. Porém, o número de operações e o tempo delas vem sendo reduzido pelo governo ao longo dos anos. Em 2011, foram três. Neste ano e em 2014, apenas uma.

"O trabalho de vigiar as fronteiras não vem
sendo encarado como prioridade de governo"

A explicação é nítida. O trabalho de vigiar as fronteiras não vem sendo encarado como prioridade de governo. O prejuízo gerado pela negligência extrapola o campo financeiro. As mercadorias contrabandeadas entram no mercado nacional, sem controle algum. 

Na prática, o livre contrabando também significa riscos à saúde dos brasileiros, concorrência desleal com os produtos nacionais (robustamente tributados), ameaça permanente aos comerciantes estabelecidos e impulso à violência porque favorece o crime organizado. Tudo, associado à expansão das chamadas “feiras do rolo” que se proliferam em todas as localidades, sem que as autoridades constituídas consigam fazer a repressão. Lamentável. Afinal, muitos males devem ser cortados pela raiz. Neste caso, já nas fronteiras.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

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