quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Alma limpa e fé renovada

2009 despede-se para a chegada de um Novo Ano. É o ciclo natural do universo. É a bênção do Criador que embala nossos corações numa toada de esperança. E, ao mesmo tempo, convida à reflexão. No balanço geral, ninguém pode desfazer o que foi feito. Nem apagar o mal feito. Mas, pode sim, assumir o lado do bem. Fazer com zelo e satisfação tudo quanto está por vir. Bastam perseverança, coragem, trabalho e fé. O recomeço é parte da mágica. Assim como o horizonte de planos que se descortina, colorindo sonhos - embriões ou maduros - e relembrando o soberano dom chamado vida.

Hoje, quando o relógio marcar meia-noite, milhões de almas estarão unidas para comungar do desejo de dias sempre melhores ao longo de 2010. Votos de saúde, prosperidade, amor e paz povoarão de energia positiva nossa atmosfera. É o momento propício para se deixar inundar de bons sentimentos e elevar os pensamentos. Nada de tristeza ou sofrimento pelo que se foi. Tudo de alegria e esperança pelo que virá.

Não importa se vai usar roupa branca, pular sete ondas ou colocar caroços de cerejas na carteira. As cores, fragrâncias e temperos do ano que chega estão dentro de cada um. A renovação se processa de dentro para fora. Para beber da força e perceber a luz, é preciso estar em harmonia. Com os familiares, amigos, com o universo, consigo mesmo.

Então, aproveite também o último dia do ano para se reconciliar com a vida. Peça perdão, perdoe, resolva mal-entendidos, agradeça, doe um pouco do que tem a quem precisa, dedique mais tempo a ouvir do que a falar, exorcize mágoas do coração, apague rancores, neutralize broncas e entre em sintonia com o Criador. Acolha o novo ano com alma limpa e fé renovada.

Recebam meus sinceros desejos do melhor de tudo. Tanto do que a vida pode proporcionar quanto do que cada um pode oferecer de si para viver bem e tornar mais feliz o dia a dia das pessoas a seu redor.

Feliz Ano Novo, com um forte abraço de paz e de bem!

Junji Abe é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Fórum e a solução para o lixo



O Fórum de Resíduos Sólidos - Alto Tietê realizado em Mogi das Cruzes, no início desta semana, comprovou que existe, sim, a possibilidade real de adoção de novas tecnologias para o manejo do lixo no Brasil. Nosso País não pode mais manter a arcaica prática de enterrar os detritos, na contramão de alternativas viáveis já utilizadas em todas as nações que respeitam a vida no planeta. Mais que isto: não há empecilho econômico-financeiro.


Por motivos óbvios, o valor do investimento para viabilizar o uso de tecnologia limpa na gestão dos resíduos sólidos sempre foi a preocupação central dos administradores públicos. Ocorre que não é necessário estatizar o sistema de tratamento do lixo. O mundo é pródigo em empresas especializadas no setor e habilitadas a bancar o investimento. A implantação de empreendimentos desse tipo depende apenas de Parcerias Público-Privadas, as chamada PPP’s.

Cabe destacar que o objetivo do Fórum – alcançado com êxito – foi discutir tecnologias limpas para solucionar o problema do lixo. Logo, não tem fundamento a suspeita de que o evento servisse a interesses comerciais de quem quer que fosse. Os resultados do Fórum rechaçam, por si, tais ilações, feitas por defensores do obsoleto modelo de aterro sanitário.

Por isto, com total legitimidade e isenção, exponho este exemplo: uma central de incineração com capacidade para 500.000 toneladas anuais de resíduos seria suficiente para atender a demanda dos dez municípios do Alto Tietê e ainda o aumento do volume de detritos produzidos ao longo dos próximos dez anos por conta do crescimento populacional. Investimento? Estimado por uma empresa européia em R$ 367,5 milhões, considerando contrato de 20 anos.

A partir de PPP, firmada após licitação pública para escolha da solução tecnológica e dos empreendedores, os vencedores do certame implantariam a central com a condição de as prefeituras da Região utilizarem as instalações pelo período de 20 anos. Explico: o cálculo do investimento do setor privado e o custo para incineração leva em conta o volume de material e o tempo de contratação da empresa. Quanto menor a quantidade de resíduos e o período de contrato, maior o montante a ser investido e mais caro o valor cobrado por tonelada a ser incinerada.

E quanto as prefeituras pagariam para incinerar o lixo? Ainda segundo a mesma empresa e condições de contratação, o custo por tonelada seria de aproximadamente R$ 115,00, incluindo coleta, transporte e destinação final. Parece muito? Não é. Em média, os municípios desembolsam hoje R$ 80,00 por tonelada de lixo enterrado.

Como é regulado pela lei de oferta e procura, o preço estabelecido pelos aterros pode ser majorado a qualquer tempo pelos proprietários – como já ocorreu no Alto Tietê –, restando às prefeituras arcar com os reajustes. A crescente distância dos aterros licenciados em relação aos pontos de coleta vem elevando cada vez mais os preços. Muitas cidades já pagam valores bem acima da média – R$ 120,00 por tonelada.

Além disso, o custo por tonelada enterrada não inclui os prejuízos gerados pela operação e posterior encerramento das atividades dos aterros sanitários. Ou seja, após 20 anos produzindo receitas para o proprietário, o local pára de funcionar. A legislação determina ao empreendedor a execução do Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) por mais 30 anos. Contudo, a impunidade e a impossibilidade de prever o que será da operadora do aterro 50 anos após a instalação, em geral, transferem o ônus ao município e, por tabela, ao contribuinte.

Considerando gastos ambientais futuros – PRAD, obras diversas, controles de infiltrações e de drenagem, queima de gases e outros serviços – é possível estimar que o custo real do uso do aterro sanitário para destinação final do lixo supere R$ 200,00 por tonelada. Logo, maior que os R$ 115,00 calculados para a incineração de uma tonelada de resíduos.

O saldo negativo extrapola a questão financeira. Basta dizer que a área de um aterro não será recuperada para produção de alimentos por, no mínimo, um século. Já o funcionamento de uma central de incineração não lesa o terreno nem emite toxinas na atmosfera, haja vista os sistemas disponíveis para impedir a emissão de poluentes. Para completar, ainda gera energia.

Em que pesem as soluções tecnológicas à disposição do Brasil, vale frisar o ponto de consenso número 1 extraído do Fórum: coleta seletiva eficiente em todos os municípios, com participação direta da população que terá a missão de separar material reciclável do lixo orgânico.

A separação para coleta seletiva, reciclagem e posterior comercialização por meio de cooperativas de catadores são engrenagens imprescindíveis ao sistema de gestão adequada do lixo doméstico. Quanto mais eficiente é a coleta seletiva, maior é o número de empregos que se abrem em centrais de triagem e reciclagem.

Fique claro, portanto, que a utilização de tecnologias limpas, como a central de incineração, em nada prejudica a atuação dos catadores. Ao contrário, aperfeiçoará e tornará mais rentável esta atividade. Desaparecerão as cenas desumanas de homens, mulheres e crianças enfronhados em montanhas de lixo para garimpar seu sustento. Esses profissionais trabalharão em centrais de reciclagem, livres das ameaças cotidianas à saúde e da degradação a que se submetem em lixões. Com organização profissional, terão melhores canais de comercialização e lucros maiores. Tudo isto, mantendo a importante função de preservar o meio ambiente.

Por fim, o Fórum deixou cristalina uma diretriz válida para todo o Brasil: a solução para a gestão dos resíduos sólidos precisa ser tratada com estudos técnicos perfeitos, procedimentos licitatórios apropriados, independentemente de mandatos, governos e colorações partidárias. E, acima de tudo, sem perda de tempo.



Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

É agir ou morrer

Mais uma vez, as enchentes causaram destruição em série e multiplicaram vítimas, muitas fatais. Diante da tragédia que manchetou o noticiário nacional, as informações sobre a Conferência do Clima em Copenhague acabaram relegadas a notas de rodapé. Fato é que o tema debatido na capital da Dinamarca tem relação umbilical com as inundações. As chuvas quase diárias nas cidades brasileiras já podem ser conseqüência de mudanças climáticas decorrentes do aquecimento global.


Longas estiagens desertificando áreas férteis, chuvas torrenciais alagando territórios, sucessão de furacões, epidemias de dengue e ressurgimento de doenças como a malária estão entre as sequelas da elevação da temperatura na Terra. Por ser gradativo, o processo se desenrola sem que a maioria das pessoas perceba.


Já se reconhece que a devastação ambiental torna impossível a sobrevivência humana. Está na destruição das matas, na derrubada de árvores na Amazônia, em ocupações irregulares de várzeas e áreas de risco, no despejo de esgotos sem tratamento nos rios, em lixões clandestinos, na fumaça de fábricas e carros...

Resta compreender que a bateria de danos ambientais inclui, entre outros, a ausência de gestão adequada dos resíduos domésticos – desde a separação do lixo e coleta seletiva até a destinação racional dos rejeitos. Destaco, aqui, a lastimável prática de enterrar o lixo.

Escondidos sob camadas de terra, os aterros sanitários emanam, sistematicamente, gases do efeito estufa. Só trazem prejuízos à saúde e ao meio ambiente. Não bastasse, são o estandarte do desperdício de energia. Ou, o desprezo à solução energética que o mundo inteiro tanto persegue. Se aproveitada com o uso da tecnologia de incineração, uma tonelada de resíduos domiciliares equivale a 250 litros de combustível, o suficiente para manter 15 carros rodando 200 quilômetros por dia, cada um.



Na Região do Alto Tietê, por exemplo, os resíduos, atualmente enterrados, poderiam garantir uma frota de 19,5 mil veículos – percorrendo 200 quilômetros diários, cada um – ou manter acesas 260 mil lâmpadas de iluminação pública por dez horas, todos os dias. É lógico que a metamorfose do lixo em energia limpa só se processa com tecnologia apropriada.



Para corrigir a rota na gestão do lixo, é fundamental a mobilização da sociedade como agente propulsor de políticas públicas. Nesse contexto, chamo a atenção para o Fórum de Resíduos Sólidos – Alto Tietê, que será realizado na próxima segunda-feira (14/12/2009), das 8 às 17 horas, no Auditório do Cemforpe (R. Antenor Leite da Cunha, 55, Nova Mogilar), em Mogi das Cruzes. É um evento gratuito e aberto ao público. Basta fazer inscrição pelo site http://www.luzdolixo.com.br/.



Todos temos muito a ver com o aquecimento global. Tanto o governo quanto o cidadão tem de fazer sua parte. De um lado, políticas públicas para incentivar a produção sustentável, prover saneamento básico com o devido tratamento dos esgotos, consolidar a educação ambiental, coibir a degradação do meio ambiente, viabilizar a coleta seletiva, reciclagem de resíduos e tecnologias limpas para gestão dos resíduos sólidos. De outro, a efetiva participação individual, com a consciência de que suas atitudes diárias fazem a diferença entre a sobrevivência humana no planeta e a tragédia universal de desabrigados ambientais sem refúgio. Participar do Fórum já é um bom começo.



Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

“A Falta que o Saneamento Faz”

Pelo menos seis em cada dez pessoas atendidas em postos de saúde e hospitais públicos apresentam problemas causados pela precariedade do saneamento básico. Seja falta de água tratada e de redes de esgotos ou ainda de tratamento para os detritos coletados, a verdade é que não há como pensar em vida saudável nem em prudência ambiental sem prover os serviços elementares de saneamento.

Fique claro que não basta coletar os esgotos domiciliares e despejá-los no rio mais próximo. É sinônimo de expandir e multiplicar problemas de altíssimo custo social e financeiro. Além da asquerosa poluição flutuante, o assoreamento dos cursos d’água facilitará a ocorrência de inundações. A primeira enchente devolverá os detritos às ruas e levará mais doenças à população. Sem contar que o tratamento da água para abastecimento será proporcionalmente mais caro quanto maior for a carga de poluentes do ponto de captação.

Pesquisa realizada pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta Mogi das Cruzes entre os dez municípios brasileiros com os melhores índices de coleta e tratamento de esgoto; e a coloca em nona posição entre as 79 cidades do País que têm mais de 300 mil habitantes.

O ranking nacional considera dados relativos a 2007. Tenho certeza de que, em 2008, a colocação da cidade será ainda melhor. Em 2003, Mogi aparecia na 71ª posição. A pesquisa "A Falta que o Saneamento Faz" coroa de êxito os esforços empreendidos ao longo do período em que comandamos a Prefeitura de Mogi. E prova que nada é impossível quando a vontade é implacável. O levantamento completo está no site
www.tratabrasil.org.br.


Quando assumi a Prefeitura de Mogi das Cruzes, em 2001, a Cidade até apresentava um bom índice de recolhimento de esgotos: 82%. Porém, lançava quase tudo (99,5%) in natura nos rios, sem qualquer tratamento. O sacrificado Rio Tietê é testemunha maior desse fato.

Num município de mais de 700 quilômetros quadrados e quase 400 mil habitantes, é tarefa hercúlea prover o tratamento dos esgotos coletados. Ainda mais porque os serviços de saneamento básico estão fora da malha da Sabesp. Mogi tem uma autarquia municipal – o Semae – que, a exemplo de outras, Estado afora, têm estrutura incapaz de fazer frente às demandas e estão descapitalizadas por causa da prática de tarifas muito aquém dos custos reais.

Descartando a transferência dos serviços à Sabesp para evitar a pesada majoração dos valores pagos pelos munícipes, fizemos a gradativa recomposição de preços. Mesmo assim, 60% da população – correspondente à classe menos favorecida – paga cerca de 70% abaixo das tarifas cobradas pela Sabesp.

Paralelamente, conseguimos a liberação de cerca de R$ 60 milhões para obras de saneamento básico, combate às enchentes e urbanização de bairros, por meio do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento.

O novo complexo de tratamento de esgotos elevou de forma substancial o percentual de detritos recolhidos e tratados. Saindo de 0,5%, em 2001, superamos 50% em 2008, com a perspectiva de eliminar, nos próximos anos, 100% da carga de resíduos domiciliares in natura despejados nos cursos d’água. Isto, claro, em razão da continuidade de boas políticas públicas pela atual administração.

Vale lembrar que quanto menor é a poluição da água captada para abastecimento, menos custará o tratamento e maior será a qualidade do líquido levado às torneiras. A redução da carga de poluentes nos rios também diminui o risco de inundações.

Dentre tantas prioridades deste nosso Brasil contemporâneo, todo gestor público que se preza tem de trabalhar com avidez para elevar a qualidade do saneamento básico. O custo-benefício é cristalino. Representa mais saúde para a população com menor demanda por assistência médica na unidades públicas, maior zelo com os recursos naturais e melhor qualidade de vida.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Por quê negro pobre não pode?

Circulou na internet um vídeo de conteúdo deplorável sob todos os aspectos. Intitulado “Manifesto Porta na Cara – Flagrante na Agência Bancária”, a produção de 3min12seg, do Núcleo Audiovisual Circo Voador, comprova a realidade do racismo no Brasil. As cenas não se passam num recôndito povoado. Ao contrário. Foram registradas na movimentada Rua da Glória, no Estado do Rio de Janeiro. Disfarçado de sistema eletrônico de segurança, o preconceito de um ser humano contra o outro irrompe de forma cristalina. É de envergonhar qualquer pessoa decente e com um mínimo de princípios morais e éticos.

O filme mostra um rapaz branco que, portando bolsa com chaves, celular e outros itens de metal, passa tranquilamente pela porta giratória da agência bancária. A mesma bolsa é transferida para um moço negro que, ao tentar entrar no banco pela mesma porta, é barrado. Depois de tirar até a camiseta, ele não consegue vencer o bloqueio. Acesse o site www.circovoador.com.br, veja o filme e tire suas conclusões.

Infelizmente, as provas da discriminação não se restringem ao pequeno universo das portas giratórias de agências bancárias. Estão em todo lugar, sob os mais variados disfarces e níveis de crueldade. A hipocrisia de negar a existência de preconceitos no País e o fato de haver um feriado em homenagem ao Dia da Consciência Negra não muda os flagrantes abusos que se repetem no cotidiano.

Negros e asiáticos estampam senhas indicativas de suas origens. Nos primeiros, é a cor da pele. Em japoneses e chineses, são os traços orientais chamados de olhos “puxados” ou “rasgados”. Conheço bem o significado do preconceito racial. Tanto eu, brasileiro, quanto meus pais e avós – imigrantes japoneses – sentimos na carne as estocadas da discriminação. Principalmente, em função da adesão do Japão ao Eixo, como aliado da Alemanha nazista, durante a Segunda Guerra Mundial. Assim como ocorre hoje, na época, havia gente preconceituosa que hostilizava imigrantes nipônicos e descendentes em retaliação à decisão do governo japonês. Muitos nos tratavam como inimigos.

Foi quando aprendi a principal lição dada pelos meus ancestrais. Apesar das circunstâncias adversas, ensinavam – a mim e a meus irmãos – a amarmos o povo brasileiro que nos acolheu. E nos mostravam que as diferenças físicas, culturais, sócio-econômicas, quaisquer que fossem, nunca estariam acima dos valores morais e dos princípios éticos de ser humano.

Assim, incorporamos o conceito de que a igualdade, o respeito às diferenças, a justiça, a solidariedade, a gratidão e a dignidade são premissas para o direito à vida. Toda discriminação, portanto, é uma estupidez. Vou mais longe. O preconceito está além da raça, da cor da pele, do formato dos olhos, do credo, da cultura.

Acredito que o maior e mais grave preconceito existente no Brasil é o social. A discriminação contra quem é pobre ou aparenta ser é latente. Basta um pouco de observação para detectar o comportamento sectário de muitos em relação aos seus semelhantes menos favorecidos. Ou, simplesmente mal vestidos. Sim, até o vestuário e a aparência sofrem demonstrações de intolerância. Quer mais que o caso da Geisy Arruda na Uniban?

Se duvida, faça um pequeno teste. Pegue a roupa mais surrada que tiver, calce um chinelo velho, deixe os cabelos despenteados e vá a uma loja para saber como será o atendimento. Outro dia, escolha seu melhor traje, capriche na produção visual e volte à mesma loja em busca de itens idênticos. Você perceberá a mudança brutal no atendimento.
A discriminação social é muito mais rotineira do que parece. Está na loja, na agência de empregos, no transporte coletivo, na rua, nos órgãos públicos, nos bancos, em todos os cenários. Também é verdade que as práticas preconceituosas tendem a se agigantar se a pessoa é negra e pobre.

Retornando ao citado filme, pergunto: Se o rapaz negro estivesse bem vestido – terno e gravata, por exemplo –, com um bom corte de cabelo e carregando uma maleta de couro com os mesmos itens da bolsa seria impedido de entrar? Acho que não. Em outras palavras, negro rico pode.

Num País como o nosso, nascido da pluralidade racial e da diversidade de culturas, com a grande maioria dos habitantes mal ganhando para seu sustento, ser intolerante com gente pobre é o cúmulo do antagonismo. Aliás, convivo diariamente com a classe menos favorecida e devo dizer que são pessoas com quem aprendi muito mais lições de amizade, solidariedade e amor.

Acima de tudo, insisto na necessidade de ações efetivas contra a discriminação. Não falo só de penalidades legais. O respeito ao próximo – e às suas diferenças – tem de ser trabalhado pela sociedade. Isto vale para escolas, para o lar, organizações sociais, iniciativa privada e também para o Poder Público.

Cada um de nós, como cidadãos, em todas as circunstâncias que a vida nos proporciona, temos de rechaçar, de forma verbal e na prática, a discriminação de qualquer tipo e fazer valer a igualdade entre os seres humanos, lembrando que somos uma única família. Por isso, enquanto prefeito de Mogi das Cruzes, instalamos as Praças Zumbi dos Palmares e a da Mesquista (Antônio Ferri) – em homenagem à cultura afro-brasileira e à comunidade islâmica, respectivamente, além de construir o Parque Centenário da Imigração Japonesa e apoiar a realização de eventos religiosos, como a Festa do Divino Espírito Santo, dos católicos; a Marcha para Jesus, dos evangélicos; entre outras ações. Tudo, como parte das políticas públicas para valorizar nosso perfil multirracial, a diversidade cultural, as múltiplas tradições e crenças.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

É preciso remediar. De graça

A prevenção é fundamental. Mas, não há que se falar em assistência à saúde sem lidar com a inevitável necessidade de remediar. Aqui, brota a inesgotável fonte de problemas de milhões de famílias brasileiras. Doença não escolhe hora, nem idade e muito menos condição econômica.

À medida em que alguém avança na faixa etária, maior é o grau de dependência do uso de medicamentos e, em geral, menor é sua capacidade financeira para custear o tratamento. Em especial, no caso de aposentados e pensionistas do INSS. Salvo raras exceções, a maioria recebe proventos ínfimos que mal cobrem despesas com alimentação.

Poucos são os que não viveram na pele o drama de familiares e amigos que amargam a absoluta falta de recursos para comprar remédios indispensáveis à recuperação da saúde, muitos de uso contínuo. Um recém-chegado de Marte poderá questionar: “Mas, e os genéricos?”.

Sim, os genéricos – cópias de medicamentos com patentes que já expiraram –, regulamentados em 1999, foram um avanço. Totalizam 2.609 tipos, que podem ser utilizados para tratar cerca de 90% das principais doenças existentes, e têm de custar, no mínimo, 35% menos que os de marca. Ocorre que a medida poderia beneficiar muito mais o consumidor, se os descontos oferecidos pelos fabricantes fossem repassados pelas farmácias ao preço final do produto.

Reportagem da Folha de S. Paulo mostrou que as farmácias compram genéricos dos laboratórios com desconto médio de 65% sobre o preço máximo determinado pelo governo aos fabricantes. Mas, vendem esses produtos por valores, em média, de 10% a 20% abaixo da tabela estabelecida para as farmácias.

Reproduzindo o exemplo do jornal, cito um medicamento que tem valor máximo de R$ 10,00 na fábrica e deve ser vendido a R$ 13,00 ao consumidor. Em função do barateamento dos insumos, por conta do real valorizado frente ao dólar, e para incentivar a aquisição de genéricos pelos pontos de venda, a farmácia compra o produto por R$ 3,50. Porém, aplica um desconto de apenas 20% sobre os R$ 13,00; e não sobre R$ 3,50. Resultado: quem precisa comprar, paga R$ 10,40 – quase 200% acima do preço de custo.

Tanto um quanto outro atuam dentro da lei, porque o governo determina valores máximos de venda para o fabricante e para a farmácia; porém, não regula a diferença entre o custo real e o preço praticado no mercado. Se a referência para o preço ao consumidor fosse o valor de custo do produto, a coisa seria diferente.

No mesmo exemplo, supondo que a legislação definisse que o preço final do medicamento seria até 30% maior que seu custo, o consumidor pagaria, no máximo, R$ 4,55. Ou seja, menos da metade do que tem de desembolsar atualmente.

É uma questão truncada, considerando o poder de fogo dos agentes da cadeia de medicamentos. Contudo, não pode ser relegada a segundo plano. Tem de ser enfrentada pelo governo. Com rigor e transparência. Há ambiente propício para a busca de soluções, haja vista a redução de custos dos insumos (importados), o fortalecimento dos laboratórios nacionais por conta dos genéricos e o aperfeiçoamento profissional das farmácias. Acima de tudo, há a necessidade premente de aliviar o sofrimento de quem precisa de remédios, mas não tem dinheiro para comprá-los.

Fique clara que a esperada extensão do benefício do desconto, dado pelo fabricante, ao consumidor final ainda está longe do ideal no Brasil, onde a população vem envelhecendo em largas proporções enquanto o sistema público de atendimento à Terceira Idade permanece minúsculo. Também não adianta mitificar as Farmácias Populares porque, quem já precisou sabe, oferecem pouco mais de 70 itens, a preços menores. Entretanto, nada é grátis.

Sem negligenciar as ações de medicina preventiva, a meu ver, a meta do governo deve ser o fornecimento gratuito de medicamentos às pessoas carentes. Não é justo que tenham de pagar pelos remédios imprescindíveispara sua cura. Como exemplo, cito o Promeg, o maior programa de distribuição gratuita de medicamentos do País, criado em 2006, durante nossa segunda gestão à frente da Prefeitura de Mogi das Cruzes.


Em linhas gerais, o Promeg é como uma rede de pequenas farmácias funcionando em 30 pontos da cidade. Com uma diferença: o paciente não paga nada. A Prefeitura adquire os produtos da FURP – Fundação para o Remédio Popular e de outros laboratórios para prover a distribuição gratuita de 136 tipos de medicamentos receitados para as doenças mais comuns, como hipertensão e diabetes.

Para ter acesso aos remédios, basta o paciente apresentar a receita médica de qualquer órgão público de saúde, inclusive da Santa Casa e dos hospitais Luzia de Pinho Melo e Dr. Arnaldo Pezzutti Cavalcanti –vinculados ao sistema SUS. Mensalmente, são distribuídas cerca de 3 milhões de unidades de medicamentos.

Repare que a iniciativa se deu em Mogi das Cruzes e foi mantida pelo prefeito Marco Bertaiolli, que me sucedeu. Não se trata de um município com receita orçamentária abundante. Tampouco, é suficiente para responder a todas as demandas da população de quase 400 mil habitantes no território de 721 quilômetros quadrados.

Contudo, a eficiência da gestão pública também se mede pela sensibilidade na priorização de medidas capazes de atender as necessidades imediatas das pessoas mais carentes. A saúde econômico-financeira só tem sentido com o bem-estar do ser humano. Espero que o governo federal não se furte desse dever.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Contra o sacrifício de outras Geisys

Embora já se tenha falado à exaustão, o episódio da estudante de Turismo Geisy Arruda que virou alvo da ira de alunos e da diretoria da Uniban (Universidade Bandeirante), por causa de um vestido curto, exige uma reflexão bem mais profunda. Não se limita à reintegração ao quadro discente da moça, expulsa arbitrariamente um dia antes. Também não se cinge à postura (má, é bom que se frise) da universidade diante do caso.

Os fatos exibem fraturas no convívio social, expostas num tempo e espaço impensáveis. Pior: protagonizados por pessoas que, em tese, têm informação e formação para abominar a intolerância, a discriminação e os preconceitos de toda ordem.

Tão preocupante quanto as reações atabalhoadas dos executivos da Uniban é o comportamento primitivo dos alunos em relação à colega. No ambiente escolar e em pleno século XXI, agiram como bárbaros na arena da Roma Antiga. Com gestos obscenos e xingamentos violentos, montaram cerco à estudante obrigando-a a se trancar numa sala até que a Polícia chegasse e a conduzisse em segurança para fora da universidade. Tudo isto por causa de uma roupa que julgavam inadequada?

Não é este País de intolerância que queremos. Não são estes os homens e mulheres com quem contamos para conduzir o futuro dos nossos netos. Há algo de muito nefasto se processando nas mentes e almas desses jovens que se revelaram preconceituosos, brutos e covardes – daqueles que têm bravura quando agem em bando, porém, sozinhos, não passam de cordeirinhos.

Igualmente funesta a atitude da universidade. Covarde e precipitadamente, juntou-se à corja de intolerantes para repetir o linchamento moral da aluna, no momento em que ela mais precisava de amparo e proteção. Num rompante nazi-fascista, culpou a vítima. E, fazendo eco a integrantes da massa hostil responsável pelo assédio coletivo, alegou “atitude provocativa” da estudante. Como é?! É o que parece. Na avaliação da Uniban, ela teria provocado os colegas. Ao que me consta, isto é argumento de estuprador...

Em propaganda nos jornais, a universidade anunciou a expulsão da estudante por “desrespeito aos princípios éticos, dignidade acadêmica e moralidade”. Ora, mas são exatamente estes princípios – aliados a conhecimentos elementares de filosofia e sociologia para entender o significado do convívio em sociedade – que se mostraram ausentes nos alunos que hostilizaram a moça e promoveram seu linchamento moral.

De todo o enredo, com transparente urgência de medidas educativas eficientes, a universidade preferiu se livrar do que entendia ser seu único problema: a aluna e seu vestido curto. É fato que a expulsão foi revogada no dia seguinte ao anúncio. É verdade também que a Uniban só voltou atrás por conta da repercussão negativa da decisão. Além de destaque no noticiário nacional, o caso foi parar na mídia internacional, como "The New York Times" e "The Guardian". Até a imprensa do Paquistão achou que a Uniban exagerou.

Não tenho procuração para defender a aluna e nem me cabe determinar a condenação da Uniban. Os desdobramentos judiciais são da alçada dos profissionais e autoridades competentes. Mas, considerando a conduta intempestiva e revoltante dos alunos, assim como as decisões da reitoria da universidade – todas desatinadas e inadmissíveis –, com certeza, serão aplicadas as devidas punições e Geisy será totalmente inocentada.

Creio que Justiça haverá de determinar a indenização da estudante por danos morais, ataque à honra e à dignidade e até por perdas de ordem financeira. Contudo, mesmo com a punição dos culpados e a restituição do que lhe cabe por direito, os estragos psicológicos causados à jovem são irreversíveis.

Por isto, a meu ver, o episódio extrapola questões legais. É preciso que se faça mais. Tanto quanto possível para que evitar o sacrifício cruel de outras Geisys. De gente que sofra calada, longe dos holofotes da mídia.

A sociedade tem de extrair as lições do episódio e, com o apoio de especialistas na área de Educação, trabalhar com afinco para orientar o equilibrado convívio social. Em especial, dos nossos jovens que precisam compreender e absorver os princípios de direito de expressão, respeito à liberdade individual, ética e moralidade. É essencial corrigir distorções, do ponto de vista pedagógico e de formação, para expurgar preconceitos e vencer intolerâncias.

Tanto na escola quanto em casa, precisamos fortalecer a estrutura que dá alicerce aos propósitos de evoluir e conviver bem em sociedade. Caso contrário, surgirão novas fraturas e cada vez menores serão as chances de tratamento eficaz para resgatar a ética, valores morais, dignidade humana e respeito mútuo, bem como preservar o direito de expressão e manter a batalha pela justiça social, livre de discriminações. De raça, credo, classe social, posição econômica, ideias, roupas, de todo tipo.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O valor dos grandes parceiros

Às vésperas da comemoração dos 12 anos do Sebrae-SP – Escritório Regional Alto Tietê, na próxima terça-feira (10/11), me vem à mente a história da minha própria formação como empreendedor, líder rural, homem público, ser humano. Na verdade, fui privilegiado ao comandar os destinos de Mogi das Cruzes por oito anos depois de haver aprendido as lições das melhores escolas em termos de organização e mobilização social.

Ao longo de toda minha vida, atuei em associações, cooperativas e sindicatos que trabalham, permanentemente, com micro, pequenos e médios empresários. Não bastasse, fui assíduo participante do sistema Sebrae e, como deputado estadual, em 1996, tive total apoio do saudoso governador Mário Covas para viabilizar a implantação da Agência Regional do Sebrae-SP em Mogi das Cruzes, o que gerou resultados fantásticos. Até então, o atendimento ao Alto Tietê concentrava-se em São José dos Campos.

Tivemos o privilégio, vale frisar, de contar com profissionais extremamente sensíveis, competentes e dedicados no comando do escritório regional do Sebrae. Todos identificados com o desenvolvimento sustentável de que a sociedade tanto necessita. Lembro-me do saudoso Mauro Hippolyto, engenheiro agrônomo que atendeu nosso convite para ser o secretário-adjunto de Desenvolvimento Econômico e Social de Mogi. Ele foi sucedido por Emerson Morais Vieira que também nos brindou com um magnífico legado de ações. Na sequência, a atual gerente Ana Maria Magni Coelho revelou-se uma exímia executiva, que coloca sua alma na missão cotidiana de interagir com a comunidade e organizações da Região em benefício da coletividade, consagrando a agência regional, em Mogi, como uma das mais produtivas do Estado.

Ao assumirmos a Prefeitura, firmamos uma parceria produtiva e contínua com o Escritório Regional do Sebrae-SP. Incrementamos e irradiamos toda a estrutura de apoio às pequenas e médias empresas. Assim, partindo de Mogi, brotaram projetos como a Intec – Incubadora Tecnológica, extensa gama de cursos voltados ao empreendedorismo em todas as atividades econômicas e, principalmente, programas de profissionalização dos agentes do mercado informal que se transformaram em microempresários.

Aliada à atuação do Sebrae-SP, a Administração Municipal multiplicou a oferta de cursos gratuitos no CIP - Centro de Iniciação Profissional, além de executar uma bem-sucedida política de desenvolvimento empresarial. A ferramenta envolveu, entre outros preceitos, desde legislação específica para atração de empresas e expansão das existentes, com incentivos fiscais, doações de áreas a pequenas e médias empresas até a instalação da primeira unidade do Banco do Povo na Cidade que, durante anos, foi campeã estadual em número de contratos formalizados. Tudo, em plena sinergia com outras instituições públicas, entidades classistas e universidades.

A bateria de ações conjuntas fomentou o crescimento industrial, oxigenou comércio, impulsionou o setor de serviços e fortaleceu os agronegócios, consolidando posições de vanguarda da Cidade na produção de hortifrútis e flores. Mogi ganhou cerca de 8,2 mil empreendimentos, entre indústrias, prestadores de serviços e estabelecimentos comerciais. Não por menos, é reconhecida pelo Ministério do Trabalho como um dos municípios que mais geraram empregos no País, no período de 2001 a 2008. Foram cerca de 115 mil, entre diretos e indiretos. Diferente de outras localidades, aqui existe o Distrito Industrial do Taboão que, preservado para a finalidade da expansão empresarial, continuará proporcionando o crescimento dos negócios com qualidade de vida.
Sintetizando, esse trabalho fez de Mogi das Cruzes – proporcionalmente à densidade populacional – uma recordista na constituição, implantação e ampliação de empresas, além de figurar no ranking nacional das 100 mais dinâmicas, ser catalogada como uma das mais bem administradas do País, uma das mais promissoras para trabalhar e uma das melhores do Estado para morar.

Tudo isso, apesar das severas restrições ambientais existentes para preservar os recursos naturais do Município que integra o sistema produtor de água destinado ao abastecimento da Grande São Paulo.

O desenvolvimento econômico registrado em Mogi foi o alicerce para a edificação dos programas que melhoraram a qualidade de vida do mogiano. Elevou a receita tributária viabilizando investimentos para fazer frente às demandas da população em áreas fundamentais como educação, saúde, segurança, saneamento básico, infra-estrutura, meio ambiente e outras.

A evolução das ações do Poder Público e da setor privado rendeu a Mogi das Cruzes, nos anos de 2001, 2002, 2005, 2007 e 2008, cinco títulos de "Prefeito Empreendedor" – Prêmio Governador Mário Covas, concedidos pelo Sebrae. Aliás, entendo que a legítima destinatária da homenagem é a Prefeitura e não a figura do prefeito.

A premiação é uma demonstração inequívoca da consideração, admiração e reconhecimento de outras cidades à posição de vanguarda de Mogi. Daí, o papel vital desempenhado pelo Sebrae, nos quatro cantos do País, como a melhor alavanca para expandir, com qualidade e solidez, as pequenas e médias empresas, assim como aperfeiçoar a atuação dos microempresários autônomos.

Fato é que a Prefeitura, sozinha, não faz nada. Também não há varinha de condão para mágicas. É com muito esforço, planejamento e parceiros, como o Sebrae, que se concretizam meios de atender as justas demandas da sociedade. A bênção é que o povo está colhendo os frutos do que semeamos. Todas as áreas, contudo, podem e devem ser aprimoradas. Longe da acomodação, nossa filosofia é a melhoria contínua. Nosso alento? Estamos no caminho certo.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Jeito natural de nascer

Vejo com tristeza o ávido crescimento da taxa de cesarianas no mundo. Na contramão das recomendações do Poder Público e de instituições representativas da classe médica, cada vez mais mulheres buscam o parto cirúrgico em vez do método natural. Há argumentos dos mais variados. Um deles remete à maciça participação feminina no mercado de trabalho com o ilusório conceito de que a cirurgia exigiria da parturiente menor tempo de repouso. Outros estão associados ao incentivo de muitos médicos que alardeiam vantagens como ausência de dor, menor sofrimento e o planejamento do parto, com dia e hora marcados.

Recente estudo divulgado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) mostra que a taxa de cesarianas subiu na rede privada brasileira. Atingiu 84,5% no ano passado contra os 79% registrados em 2004. Já no setor público, a média nacional gira em torno de 31%. No Estado de São Paulo não é diferente. Em todas as regiões paulistas, a proporção de partos cesarianos supera – e muito – o máximo de 15% recomendados pela Organização Mundial de Saúde.

Não sou médico. Mas, como gestor público que fui quando comandei a Prefeitura de Mogi das Cruzes – Região Metropolitana de São Paulo, o nível de atenção à saúde da mulher foi um dos pontos que mais me chamou a atenção. Durante as reuniões do Plano de Governo Participativo – elaborado em conjunto com a população – ouvimos depoimentos chocantes, como o de Maria: 27 anos, seis filhos, o sétimo a caminho e nunca fizera exame de prevenção do colo do útero. A filha mais velha, de 14 anos, entrara no quinto mês de gestação sem ter passado por um único exame pré-natal.

Por quê? Nas palavras de Maria, confirmadas por outras centenas de mulheres, uma consulta com ginecologista parecia quase tão difícil quanto enfrentar as dores do parto. E se a criança já não tinha assistência no ventre da mãe, também não receberia cuidados adequados depois de nascer. Não por menos, a cada mil bebês que nasciam com vida, 44 morriam antes de completar o 1º ano. Esta era a realidade em 1999. Bem mais que dados afrontando as políticas vigentes na área da saúde, a morte dessas crianças torturava famílias, frustrava sonhos e violentava a dignidade do ser humano, transformando nascer e viver numa missão de alto risco. A mulher – gestante, lactente, mãe –, sofria as agruras de quem está no centro do redemoinho, à mercê da sorte.

Assumimos a Prefeitura em 2001 com uma filosofia de governo alicerçada na qualidade de vida dos moradores. Significa que o ser humano vem em primeiro lugar. É nele que está o foco. Tudo mais tem de ser ajustado a esse propósito. Fique claro que os cuidados começam quando ele ainda está na barriga da mãe. E se estendem ao longo de sua existência. São conceitos de prática obrigatória em todas as áreas da Administração Municipal.


Desinformação da população, precariedade do saneamento básico, inexistência ou baixa oferta de exames de diagnóstico e deficiências estruturais da rede municipal de saúde – escassez de profissionais e de equipamentos – emergiam como os principais fatores a serem atacados. Essas falhas do sistema municipal de saúde vitimavam, principalmente, a mulher. É ela quem vive o drama da gravidez não ou mal assistida. É ela quem assume a maior e mais importante parcela de responsabilidade pela criação dos filhos. É ela quem orienta e monitora as ações cotidianas em casa. É ela o agente da formação e transformação de hábitos.

Esses e outros motivos tornaram cristalino o fato de que qualquer avanço em saúde depende da qualidade do atendimento à mulher. Daí, o motivo da revolução levada adiante pela Prefeitura. Reorganizamos a rede municipal, otimizamos recursos existentes, ampliamos e aperfeiçoamos o atendimento, a frota de ambulâncias e, em especial, o time de profissionais. Por exemplo, em pouco mais de um ano, o número de ginecologistas subiu de 16 para 40; e o de pediatras, de 28 para mais de 60.

O pacote de medidas incluiu o reforço dos programas de vacinação, a instalação do Laboratório Municipal de Análises Clínicas e sete unidades do Programa Saúde da Família. Não bastasse, desenvolvemos um novo conceito de assistência à população feminina, materializado na operação do Pró-Mulher. Junto com ele, veio uma bateria de benefícios. Desde a completa assistência Pré-Natal até programas dirigidos à gestação de alto risco, passando pelo combate às carências nutricionais planejamento familiar para evitar a gravidez precoce e saúde bucal para gestantes e bebês. Ao mesmo tempo, instalamos o Comitê de Investigação de Óbito Materno-Infantil.


Investimos mais. Lançamos a segunda unidade do Pró-Mulher, implantamos o Pró-Parto, o Promeg (distribuição gratuita de medicamentos), o Pró-Criança e o Programa Saúde na Comunidade – que leva um mutirão de serviços aos bairros onde não há unidades de saúde –, entre dezenas de outros.

O município também assumiu as ações básicas de Vigilância em Saúde, com destaque para os trabalhos de orientação e campanhas de prevenção. Em 2006, Mogi ganhou um Centro de Controle de Zoonoses, dotado de tecnologia de ponta e classificado como um dos mais modernos do País. A estrutura permitiu, por exemplo, a inédita campanha de esterilização gratuita de cães e gatos, além da vacinação em massa. Até 2000, sequer tinha veterinários na rede.


É bom citar que reativamos a produção conjunta entre as três esferas de governo que movimentam as engrenagens da saúde pública. O Estado concluiu a ampliação do Hospital Luzia de Pinho Melo. Já o trabalho integrado entre governos e sociedade viabilizou o processo de recuperação da Santa Casa. Quanto maior a sinergia entre esses parceiros, melhor a produtividade e maiores os dividendos da população.

Mortalidade infantil cai 47%

O conjunto de ações repercutiu sobre as taxas de mortalidade materna e infantil. Em 2002, o indicador já havia caído de assombrosos 21,5, do ano 2000, para 17,3 por mil nascidos vivos. Em 2005, ficou em 12,9 mortes a cada mil nascimentos. Pela primeira vez na história, o município teve menos mortes de bebês que a média registrada no Estado (13,5). Dados da Fundação Seade mostram queda de 47% nos últimos nove anos. O ano de 2008 terminou com 11,3 mortes, índice que pode ser comparado aos de países do Primeiro Mundo. É lógico que ainda não estamos satisfeitos. Todos os esforços perseguem o ideal de zerar a mortalidade infantil e materna.

Ao mesmo tempo, cresceu o número de gestantes adeptas do parto normal em relação àquelas que recorrem à cesariana. Agora, nossas expectativas se voltam para a continuidade das ações que revolucionaram o jeito de lidar com a saúde do povo. E que dão bons frutos. É preciso manter ativos as campanhas de conscientização e os esforços coletivos para reduzir a taxa de cesarianas no Brasil. A meta é que cada vez mais mulheres optem pelo método natural. E tenham toda assistência para sustentar esta escolha. Tanto no sistema público quanto na rede privada.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Além das comemorações

Passada a comoção das festividades do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, entram em foco os desdobramentos da relação bilateral entre os dois países. Brasileiros e japoneses têm pela frente o desafio de transformar a irmandade instalada há 100 anos em conexão permanente para o desenvolvimento mútuo nos diversos campos do conhecimento.

Esse foi o cerne do Simpósio de Avaliação do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, promovido pela Fundação Japão. Foram dois dias de atividades divididas em oito grupos de trabalho para abordar, com a participação de debatedores ilustres, as múltiplas faces da imigração japonesa, seus reflexos na sociedade brasileira, os resultados da integração entre os dois povos e as perspectivas para o futuro.

“Toda vez que você beber água de um poço, precisa fazer uma profunda reflexão no sentido de agradecer todas as pessoas que trabalharam para construí-lo”. Com esta frase, traduzida de um poema japonês, o diretor da Fundação Japão, Jo Takahashi, enfatizou a importância do sentimento de gratidão no contexto. Os agradecimentos estendem-se a todos que trabalharam anonimamente para o êxito das ações dos imigrantes, assim como para a evolução da relação bilateral Brasil-Japão.

Este sentimento de gratidão é muito forte em mim. Desde criança, ouvia dos meus avós e pais, imigrantes japoneses, que era preciso “amar este País, de todo coração, ajudar o povo em tudo o que for possível e fazer mais pelo Brasil que os próprios brasileiros”.

Mais do que palavras na mente da criança que fui, são princípios gravados na alma do homem que sou. Traduzem gratidão à Nação que acolheu a nossa e tantas famílias vindas do outro lado do mundo. Demonstram o afeto por esta gente alegre, hospitaleira e carinhosa que passou por cima de todas as diferenças, não viu barreiras culturais e nem de idioma para interagir e estabelecer os laços que se consolidaram sob a linguagem universal da emoção.

A coincidência do último ano da nossa administração à frente da Prefeitura de Mogi das Cruzes com a data histórica do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil nos levou a buscar algo que resgatasse a lembrança da epopéia de dificuldades, sofrimento e de mil obstáculos superados. E que mantivesse aceso nos descendentes o dever e o prazer da gratidão ao povo brasileiro. Mas também desse, a todos nós, brasileiros, a chance de reafirmar a admiração e o reconhecimento aos batalhadores do País do Sol Nascente. Ao mesmo tempo, que nos permitisse agradecê-los pelo tanto que fizeram pelo desenvolvimento da nossa Pátria. E por semearem a credibilidade, organização, solidariedade, disciplina, seriedade, amor ao trabalho e outros valores tão nobres.

Tinha de ser algo que propiciasse, por no mínimo mais 100 anos, o contínuo fortalecimento da relação bilateral entre Brasil e Japão. E que fomentasse o vigoroso intercâmbio tecnológico, ambiental, econômico-financeiro, cultural e tantos outros, avançando, além do tempo, o aprendizado mútuo inaugurado com o convívio entre os dois povos.

Mas, não era só. Tinha de ser algo que retribuísse, pelo menos um pouco da confiança e da amizade ofertadas pelos brasileiros. Em especial, pelos mogianos. Tinha de ser algo grandioso como a ligação entre os dois povos. E vivo, capaz de evoluir, transformar e de ser transformado.

Assim, surgiu o Parque Centenário. Erguido sobre uma área degradada onde só havia crateras herdadas da intensa exploração mineral, às margens do vital e lendário Tietê que, solitário e calado, chorava a devastação. Seguindo a lição dos imigrantes que coloriram nossas terras com a produção agrícola, recuperamos o espaço de 215 mil metros quadrados. Centenas de cerejeiras – símbolo do Japão – compartilham espaço com os nacionais ipês, paus-Brasil e quaresmeiras, avivando a paisagem em perfeita sintonia. Tal qual o relacionamento entre japoneses e brasileiros.

Agregando valor cultural, destacam-se equipamentos e atrações, como o Memorial da Imigração, Memorial do Parque, Memorial de Seki e Toyama – cidades-irmãs de Mogi –, Espaço Bom Odori e Samba, Ilha do Torii, balsa, pontes flutuantes, chafariz, ponte em arco, playground, mini-campo de futebol, quadra de vôlei, chalés, churrasqueiras, uma fantástica réplica do Navio Kasato Maru e o Pavilhão das Bandeiras unindo os estados brasileiros às províncias japonesas.

É um espaço que revigora os ânimos exibindo a prova de que nenhuma adversidade é intransponível. É branco, amarelo, preto, vermelho, de todas as cores, furta-cor. Está acima das raças e crenças. É multicultural. Também faz um chamado à necessidade de sonhar sempre. E de trabalhar para realizar cada sonho. É ainda um tributo à fé na humanidade, à grandeza dos sentimentos, ao valor da amizade.

O Parque Centenário materializa a reciprocidade de sentimentos. Homenageia japoneses e descendentes com a memória da imigração e a reprodução de ícones da arquitetura nipônica. Homenageia os mogianos com um espaço público para o lazer, atividades culturais e, principalmente, para incentivar o convívio familiar.

Os ricos debates que se processaram ao longo do Simpósio renovaram minha convicção de que o Parque Centenário abriga os conceitos fundamentais definidos para homenagear, em mão dupla, os 100 anos da Imigração Japonesa no Brasil.

Isto, porque não termina com as festividades. Ao contrário, abre contínuos horizontes de possibilidades. E faz ecoar, de Mogi para o mundo, o genuíno exemplo de intercâmbio plural, cooperação mútua, coexistência pacífica e verdadeira amizade entre Brasil e Japão. Foi assim há um século. É assim hoje. Será ainda mais amanhã. Em especial, porque nutro a fé de que, com a luz divina, havemos de ter êxito na perseguição dos objetivos primordiais de toda a humanidade – igualdade, com respeito à diversidade, justiça social, qualidade de vida e paz. Afinal, já temos um bom começo.


Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Certeza na mente e pés no chão

Não sou engenheiro ambiental nem biólogo ou tampouco especialista em gestão de recursos sólidos. Sou, acima de tudo, um ser humano, em pleno exercício da cidadania, que preza o direito de viver, respeita a biodiversidade e tem a convicção de agir, com todas as forças, para evitar o extermínio da qualidade de vida do cotidiano das gerações futuras no planeta.

Como tal, me sinto no dever de rechaçar, veementemente, a ideia de implantação de um novo aterro sanitário. Seja em Mogi das Cruzes ou qualquer outra região. E tanto faz que seja um empreendimento da Queiroz Galvão, do Zé ou do Mané. O fato imutável é que enterrar lixo é um sistema arcaico, extremamente danoso ao meio ambiente e um inimigo voraz da qualidade de vida. Não adianta dizer que este ou aquele modelo de aterro é adequado, porque cumpre as normas de órgãos governamentais. Isto não existe.

Para se ter noção da herança maldita de um aterro, basta citar que, esgotada a vida útil do empreendimento, é necessário desenvolver um Plano de Recuperação Ambiental (PRAD) para a área, invariavelmente gigantesca. E pasmem: o local não pode ser aproveitado para absolutamente nada por 40 anos. É o sepultamento do que foi enterrado.

Falar em aterro sanitário moderno é o supra-sumo da contradição. É tão incoerente quanto mesquinho no mundo globalizado, onde a informação trafega sem fronteiras. Já se vão mais de três décadas que outros países utilizam alternativas ambientalmente adequadas e viáveis sob o aspecto econômico.

Das tecnologias empregadas, a mais comum é a incineração dos descartes que não podem ser reciclados. É uma etapa antecedida por coleta seletiva e triagem. Em países como o Brasil, onde há produção agrícola em larga escala, é possível aproveitar a riqueza do lixo e reduzir o volume de detritos a ser incinerado. Basta submeter os resíduos orgânicos à usina de compostagem, que gera corretivo de solo e adubo para as lavouras (veja detalhes na postagem “A gestão do lixo”, de 06/10/09).

A Região do Alto Tietê – que engloba dez municípios – vive uma situação crítica para destinação final do lixo. Dos aterros licenciados, um foi interditado e o outro terá sua capacidade esgotada em curto espaço de tempo. Em reunião para tratar do assunto, os prefeitos ouviram do secretário de Estado do Meio Ambiente, Xico Graziano, a abominável afirmação de que a melhor solução para o problema é a implantação de um aterro sanitário regional. E devolveu a batata quente aos governantes municipais, que saíram da Secretaria com a incumbência de estudar áreas para acomodar o malfadado empreendimento.

Ora, poupem-nos, todos, dos contornos surreais do caso. Não faz nem três anos que Mogi das Cruzes, a duras penas, derrotou o espectro de virar sede do aterro projetado pela Construtora Queiroz Galvão. A repulsiva ideia, então, arquivada corre o risco de retornar à pauta de análises dos órgãos ambientais. De carona no drama da destinação do lixo, a empresa já havia pedido a reabertura do processo de licenciamento. Agora, somou a seu favor a manifestação do secretário.

O escabroso plano da empresa é instalar um aterro no Distrito Industrial do Taboão, em Mogi – o maior e único espaço disponível na Região Metropolitana para expansão empresarial. São mais de 12 milhões de metros quadrados, o bastante para abrigar 80 empresas, empregar 45 mil pessoas e injetar nos cofres públicos cifra anual de R$ 40 milhões referentes a impostos. Autorizar a instalação de um aterro sanitário regional na área seria macular esse horizonte com uma cortina de repulsa a outros investimentos. E pior: mutilar a perspectiva de desenvolvimento da Cidade e de ascensão da qualidade de vida do povo mogiano.

A importância do Taboão no contexto sócio-econômico não se cinge ao território mogiano. É lá que também está a possibilidade de empregos e geração de renda para habitantes de cidades vizinhas, como Biritiba Mirim e Salesópolis, onde severas restrições ambientais impedem a instalação de empresas e o consequente aumento do nível de empregabilidade.

Por todos estes motivos, a sociedade não pode ficar silente nem passiva. O que está em jogo é a vida, projetada no ambiente que deixaremos para nossos filhos e netos. Em Mogi, já foi resgatado o Movimento “Aterro Não!”, do qual faço parte, com muito orgulho e uma determinação maior ainda: vamos provar às autoridades que existe solução viável para destinar os rejeitos domiciliares sem massacrar o meio ambiente. E exigir que a Cidade e a Região tenham a atenção de direito dos governos estadual e federal.


Os integrantes do Movimento trabalham intensamente para realizar o Fórum com o objetivo de apresentar sistemas alternativos para o tratamento de lixo, envolvendo toda a sociedade no debate. Embora muitos se espantem, a adequada destinação do lixo tem a mesma importância do recolhimento e tratamento dos esgotos domésticos. Em ambos os casos, os procedimentos corretos significam preservação ambiental e melhoria da saúde pública.

Também não há que se dizer que os custos inviabilizam sistemas alternativos aos aterros. Há empresas que se propõem a efetivar empreendimentos a custo zero para os cofres públicos. E mesmo que seja necessário bancar o investimento, os resultados são compensadores. Ou alguém acha que é caro demais garantir a qualidade de vida das gerações futuras?

Precisamos conhecer tecnologias apropriadas à gestão dos resíduos domiciliares, sob os aspectos de prudência ambiental, viabilidade econômica e ganho social, para selecionar o projeto que melhor atende às necessidades da região. A partir daí, lutar pela sua execução, convencendo as autoridades a responderem com eficiência e sensatez o justo clamor popular.

Portanto, faço um apelo a cada cidadão mogiano: venha participar do fórum, engrossar o coro do Movimento, levantar a voz contra o aterro e gritar pela adoção de um sistema adequado de destinação dos resíduos domiciliares. Estendo o pleito a todos os moradores do Alto Tietê porque está claro que a solução para o problema do lixo tem de ser regional. E, acima de tudo, coerente. Até porque a Região é pólo produtor de água para a Grande São Paulo e conserva significativas porções de Mata Atlântica.

Entendo que não basta livrar Mogi das Cruzes do aterro sanitário. É preciso extinguir a prática de enterrar os descartes domésticos, dando ao lixo os mecanismos da imprescindível transformação para assegurar o ciclo da vida. Já temos a certeza na mente e os pés no chão. Agora, precisamos nos manter unidos e fortes para fazer valer nossa vontade, resguardando nosso direito ao desenvolvimento sustentável, com qualidade de vida.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Migalhas de reforma eleitoral

É evidente que as intervenções pontuais realizadas na minirreforma política e eleitoral ainda estão muito distantes da imprescindível reforma, modelada com justiça e eficiência. Do que se fez, entendo que a liberação do uso da internet foi positiva. Não fazia sentido caminhar na contramão da atualidade, impondo restrições à utilização da rede mundial ou equiparando a ferramenta a veículos de comunicação como rádio e TV.

Fato é que, enquanto não houver coragem para efetivar uma profunda e irrestrita reforma política e eleitoral, capaz de atender as necessidades do País e da população, as intervenções pontuais não passarão de remendos. É como criar um Frankenstein, a partir de restrições que, de tão incoerentes, acabarão tirando do povo o direito de conhecer, analisar e escolher os candidatos.

Não há que se falar em igualdade de condições sem que haja a mesma possibilidade de exposição a todos os concorrentes. Ocorre que isto não se dará enquanto perdurarem graves distorções no sistema político-eleitoral. Começa pelo excesso de partidos políticos. Entendo que não deveria haver mais de seis, de forma que todos se apresentassem fortalecidos, sustentando as respectivas ideologias e exercendo real poder de decisão. Assim, sólidas, as agremiações seriam o porto seguro da democracia, o melhor regime existente.

Em outras palavras, a legenda responderia pelos candidatos, neutralizando o personalismo em benefício do partido. Isto também viabilizaria o trabalho imparcial da Imprensa e resgataria a governabilidade porque o detentor do mandato, eleito, não seria o agente de negociações com quem quer que fosse. Tudo ficaria a cargo do partido. Somado a isso, vale frisar que sou adepto incondicional do voto distrital.

A política é a arte de praticar o bem comum. Porém, a atuação irresponsável de determinados políticos joga toda a classe política na vala comum do descrédito, esfacelando o único elemento que une homem público e população: a confiabilidade. É uma sintética exposição da minha opinião, considerando a multiplicidade de transformações de que o sistema necessita para cumprir sua função social. Resumindo, chega de remendar a legislação com maquiagem chula. Já passa da hora de executar a verdadeira reforma político-eleitoral.


Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

terça-feira, 6 de outubro de 2009

A gestão do lixo

De fato, é nosso dever cuidar da adequada destinação final do lixo para garantir o bem-estar das gerações futuras. O primeiro projeto de Lei que apresentei como deputado estadual, logo que fui empossado no cargo em 1991, previa a criação de consórcios para instalação de usinas de compostagem.

Como cidadão, reafirmo total contrariedade ao modelo obsoleto de enterrar lixo. Enquanto prefeito de Mogi das Cruzes, recusei a cessão de uma área escolhida pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente. Explico: o que se pretendia fazer era utilizar a verba federal do PNMA II (Programa Nacional do Meio Ambiente) na instalação de um aterro sanitário regional – para receber detritos de todo o Alto Tietê – ao lado do Lixão da Volta Fria, aquele que, com muito esforço, tínhamos conseguido desativar.

Justificando nossa repulsa à malfadada ideia, mostramos ao representante do Estado no PNMA II, Martinus Filet, o conceito do tratamento que consideramos viável para a questão, em nível regional. Consiste na prática eficiente da coleta seletiva, operação de centrais de triagem, implantação de usinas de compostagem – três bastariam para a Região – e, posteriormente, a instalação da usina de incineração (a chamada Usina Verde).

Aí, sim, Mogi estaria pronta para ceder área, começando por abrigar uma usina de compostagem. É nesta direção que trabalhamos após a desativação do Lixão da Volta Fria.

A usina verde tem custo estimado em cerca de R$ 300 milhões. Já a usina de compostagem, que transforma resíduos sólidos em adubo orgânico, demanda bem menos – algo em torno de R$ 2 milhões. Aliás, era este investimento que pretendíamos fazer na área vizinha ao antigo Vazadouro da Volta Fria. A simples operação de uma unidade de compostagem aumentaria muito a vida útil dos aterros sanitários e, por fim, a usina verde sepultaria a existência deles.

A efetivação do projeto em duas etapas leva em conta as dimensões continentais do Brasil, a agricultura pujante como consumidora de adubo orgânico, as necessidades da população, valores dos investimentos e o prazo para revisar a legislação vigente incluindo diretrizes à operação de novas tecnologias na gestão de resíduos sólidos.


Vou dar números. Se, atualmente, a Região produz entre 500 e 600 toneladas diárias de lixo, com os processos de coleta seletiva, reciclagem e compostagem, o volume cairia aproximadamente 70% - baixando para cerca de 120 toneladas por dia. Seria esta carga – equivalente a 30% do total gerado – que iria para a usina de incineração (verde), produzindo energia elétrica. Ao final, restariam menos de oito toneladas (perto de 6%) de cinzas, devidamente transformados em fertilizantes e componentes de materiais para construção civil, como asfalto e concreto.

Para preparar o estudo, nos municiamos das mais privilegiadas fontes. Já em 2006, eu e demais representantes das cidades integrantes da Amat (Associação dos Municípios do Alto Tietê), visitamos a Universidade Federal do Rio de Janeiro para conhecer o protótipo da usina de incineração – a única do País – que opera com capacidade minúscula – seis toneladas de resíduos por dia. Só Mogi produz cerca de 250 toneladas.

Em 2007, visitei três das 17 usinas de incineração existentes na cidade de Nagoya, no Japão. Do total de lixo domiciliar gerado, 30% são reciclados por conta da adesão popular à coleta seletiva. Os 70% restantes seguem para as usinas. A maior parcela vira energia, aproveitada nas áreas urbanas do entorno. Sobram de 5% a 6% do volume total, transformados em fertilizantes e componentes para construção civil.

Todos estes fatos e nosso parecer estão devidamente registrados nas atas das reuniões da Amat. A maioria foi noticiada pela Imprensa. A primeira sinalização positiva da Secretaria do Meio Ambiente à proposta das usinas de compostagem veio no final de 2007, com a informação de que o Estado faria os projetos executivos das unidades, o que possibilitaria aos municípios se organizarem em consórcios. Ocorre que o plano não avançou porque, em 2008, tudo ficou suspenso em função das restrições impostas pela Lei Eleitoral.

No final de 2008, em nova reunião com Martinus Filet, soubemos que o projeto da usina verde não poderia ser desenvolvido em menos de quatro anos porque a questão da emissão de gases e outros aspectos relacionados ao empreendimento ainda não estavam regulamentados.

Apesar das eleições municipais, não há necessidade de começar o processo da estaca zero. Não só a Prefeitura de Mogi como a Amat tem elementos suficientes para buscar esta conquista: melhorar a coleta seletiva, viabilizar a reciclagem, implantar usinas de compostagem e, posteriormente, instalar a usina de incineração (verde). No mais, estou à disposição para participar de um debate público sobre o tema e contribuir tanto quanto possível na solução do problema.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Releitura de 15 anos do Plano Real

É preciso trazer à luz os fatos que caracterizaram o cenário nacional ao longo de quase duas décadas, entre o início dos anos 70 e o lançamento do Plano Real, em 1994.

Os primeiros sinais de inflação foram detectados em 1975 e se transformaram numa escalada inflacionária crescente ao longo dos anos seguintes. Tanto, que houve uma sequência de planos emergenciais para estabilização da moeda – Cruzado, Verão, Bresser, Collor e outros. Todos naufragaram.

O Brasil vivia uma situação caótica com índices inflacionários que atingiam 90% ao mês. As classes produtivas e trabalhadora foram as mais sacrificadas. A proliferação da desigualdade social se deu em proporções nunca vistas na história do País. Quem produzia e trabalhava, só perdia dinheiro. Quem aplicava no mercado financeiro – os poucos abastados – , só ganhava dinheiro.

Foi o tempo da ciranda financeira com concentração de renda nas mãos de poucos privilegiados e a acelerada deterioração da qualidade de vida do povo. As remarcações de preços ocorriam diversas vezes num período de 24 horas. O salário recebido num dia perdia cerca de 20% do poder de compra nas 48 horas seguintes.

As contínuas quedas de padrão sócio-econômico davam a tônica da situação. Aqueles que se enquadravam na classe B, caíam para C ou D e, assim, sucessivamente, levando para as favelas ocupantes de habitações de nível médio e para debaixo das pontes quem já vivia em submoradias. Paralelamente, o governo não dispunha de recursos para investimentos em setores básicos, sepultando a qualidade de serviços públicos. O País chegou a ter 40 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza. Muitos fizeram o caminho inverso de seus antecessores – os imigrantes –, buscando sustento em países europeus, nos Estados Unidos e Japão.

Foi este o cenário encontrado pelo, então, senador Fernando Henrique Cardoso que, a convite do presidente Itamar Franco, assumiu o Ministério da Fazenda. Do trabalho dele e de uma equipe plural de economistas, nasceu o Plano Real, o único extremamente consistente e que não naufragou na meta de estabilização da moeda nacional.

Ao longo da sua existência, o Plano Real passou por uma série de ajustes para associar a manutenção da moeda forte à necessidade de adequação à globalização da economia e a consequente concorrência internacional.

Fato é que o alcance das metas do Plano Real está umbilicalmente ligado ao desempenho de Fernando Henrique em seus mandatos na Presidência da República. Foi na gestão dele que surgiu um instrumento essencial ao suporte das ações para estabilização econômica: a Lei de Responsabilidade Fiscal, que colocou os governos – nas três esferas de Poder – sob austera vigilância para o cumprimento do equilíbrio orçamentário fiscal e financeiro.

Estas ações efetivas resgataram o Brasil do fundo do poço. Os setores produtivos evoluíram e, junto com eles, a oferta de emprego e a riqueza. A desigualdade social começou a diminuir e a classe média voltou a ter representatividade na composição da pirâmide social. Os avanços estão explícitos no cotidiano dos brasileiros que passaram a ter condições de acesso a bens antes restritos a poucos, como moradia, eletro-eletrônicos, celulares e carros.

Não por menos, embora a densidade populacional do Brasil tenha crescido em aproximadamente 60 milhões de habitantes nos últimos 15 anos, o número de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza caiu mais de 50% em relação ao início dos anos 90.

Também não foi à toa que o governo Lula abandonou os discursos de campanha para seguir os princípios de gestão adotados por Fernando Henrique. Digo isto com a honestidade de quem acredita que o que realmente importa é que os brasileiros tenham uma vida melhor.

Ninguém bate o Brasil em três reinos: animal, vegetal e mineral. Temos todas as condições de evoluir economicamente, com justiça social, prudência ambiental e austeridade no Poder Público. Ao governo, cabe cuidar com total desvelo dos setores que considero elementares – Educação, Saúde, Segurança, Habitação, Infraestrutura e Saneamento Básico.

Quanto ao futuro do Plano Real, há de se cuidar da correta aplicação do dinheiro público combatendo o déficit causado por desajustes de gestão no controle de gastos. Isto vale para as três esferas.

Seria eficiente se todos os municípios da Federação seguissem práticas de Mogi das Cruzes. Como exemplos, cito os gastos com folha de pagamentos que ficam limitados à faixa dos 35% da arrecadação. Há também o cuidado de priorizar e hierarquizar as necessidades coletivas nos setores essenciais, respeitar e preservar o meio ambiente e impulsionar a iniciativa privada, tanto quanto possível, para gerar empregos e renda.

Entendo que falta ao Brasil realizar uma grande reforma no sistema político e eleitoral, viabilizando maior participação da sociedade nas decisões de governo. Este é o caminho para efetivar as outras imprescindíveis reformas – Tributária, Previdenciária e Trabalhista.

Em suma, a longevidade do Plano Real depende do nível de responsabilidade e comprometimento dos governos. Afinal, temos quase todos os elementos para consolidar, com sustentabilidade, o desenvolvimento econômico e social. Portanto, podemos projetar uma vida melhor.”

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes