sexta-feira, 28 de maio de 2010

Divina Bandeira





“Os devotos do Divino vão abrir sua morada
Pra bandeira do menino ser bem-vinda, ser louvada.
Deus nos salve esse devoto pela esmola em vosso nome
Dando água a quem tem sede, dando pão a quem tem fome...”
Ivan Lins
O ser humano recebeu de Deus sentimentos que se manifestam interna e externamente, de formas diversas. Por vezes, vêm suaves; noutras, intensos, conforme os acontecimentos. Alegria, tristeza, satisfação, preocupação, raiva, revolta, gratidão e emoção, dentre inúmeros outros, fazem parte da nossa existência.

Pinço rapidamente dois – emoção e gratidão. Elejo-os como os principais para nortear este artigo. Seria muito egoísmo da minha parte se não divulgasse os acontecimentos vividos com a Bandeira do Divino Espírito Santo. Confesso que, gostaria de ser poeta para fazer as palavras bailarem à altura da indizível emoção. Como não sou, talvez não encontre o texto adequado para descrever o que me vai na alma. Contudo, não falta o necessário desejo de relatar minha grata experiência.

De 1991 a 2000, desempenhando a honrosa função de deputado estadual, todos os anos, me postava no palanque instalado no Largo Bom Jesus, em frente à Igreja de São Benedito, na querida cidade de Mogi das Cruzes. Dali, acompanhava a Entrada dos Palmitos. Trata-se de um cortejo fabuloso, com milhares de devotos, cada qual carregando a Bandeira do Divino e cantando, com fervor. Há também os grupos de congada e marujada, tocando e dançando, cavaleiros desfilando com seus imponentes animais, carros de boi enfeitados – em gratidão à colheita –, passando ao som do rangido característicos das rodas e muitas crianças – umas concentradas, outras infinitamente alegres. Tudo, com a predominância da cor vermelha, numa autêntica manifestação de fé e louvor ao Divino Espírito Santo.

Gente, sinceramente, são indescritíveis os sentimentos. Fluem pelas artérias, abraçam cada neurônio e fazem a alma transbordar sob a forma de lágrimas que, silenciosamente, molham a face externando uma minúscula parcela de tanta emoção.

Aqui, registro toda gratidão à amiga Leila Mathias que, por ser de família tradicional de Sabaúna, todos os anos fez questão de me convidar para a Festa do Divino Espírito Santo de Sabaúna. Foi assim que conheci melhor, me apaixonei e comecei a amar cada instante dessa celebração da Igreja Católica.

Sempre levei em consideração os ensinamentos dos missionários, fossem bispos ou padres, de que o aspecto festivo do Divino deve ser precedido, fortemente, pela parte religiosa, com o propósito de plena evangelização. Por isto, em 2001, no primeiro ano de nosso mandato como prefeito, solicitei à Comissão Pró-Festa do Divino, que avaliasse a possibilidade de instalar o Sub-Império na sede do Poder Executivo. Resposta positiva. Que emoção!


A equipe do Fundo Social de Solidariedade de Mogi das Cruzes, comandada pela minha esposa Elza e pela professora Marlene Alabarce, cuidou de todos os detalhes. Então, pela primeira vez, com as ilustres presenças do Padre Vicente Morlini, Festeiros e Capitães de Mastro, devotos, voluntários e servidores municipais, recepcionamos o Sub-Império. E, de lá para cá, todos os anos, este sagrado ato religioso se repete. A fé, somada à participação popular e parceria com a sociedade, garantiu dois mandatos auspiciosos.


Estimulados pelas amigas Marlene, Leila e outras companheiras, em 2001, Elza e eu participamos da Entrada dos Palmitos. Tive a suprema honra e alegria de carregar a Bandeira do Divino do saudoso José Roberto Manna de Deus, cedida pela sua esposa, nossa inesquecível amiga Amália Manna de Deus. Que responsabilidade! Mas, Deus, com Sua infinita bondade e sabedoria, deu-me forças para que a sagrada bandeira fosse conduzida por mim, altaneira, como tem de ser. A emoção foi nossa cúmplice do início ao fim.

Quando falo da Amália, preciso destacar a mulher excepcional, exemplo de bondade, amada na Cidade e sempre pronta a ajudar a todos. Mogi aprovou nossa sugestão de fazer-lhe uma homenagem póstuma dando seu nome ao Pro-Hiper – um centro especializado no atendimento à Terceira idade –, lugar de respeito, reconhecimento, gratidão, amparo e amor às pessoas, qualidades que Amália reuniu e praticou cada dia da sua vida.

Que Nosso Senhor possa transmitir ao casal Manna de Deus, lá no plano celestial, nossa eterna gratidão. Nos anos seguintes, o filho Caíque, em nome da família, continuou me cedendo a Bandeira do Divino. E assim participamos dos cortejos da Festa do Divino Espírito Santo ostentando, orgulhosos, o estandarte.

Este ano, a amiga e festeira Flávia Cassola Silva encomendou, a meu pedido, uma Bandeira para nossa família. É maravilhosa, fantástica mesmo. Fui às lágrimas quando o sagrado estandarte do Divino foi benzido pelo pároco. No sábado, dia 16, carreguei a Bandeira do Divino na Entrada dos Palmitos. Com todo orgulho que ela inspira e toda humildade que a celebração exala. À Flávia e Jefferson, nossa profunda gratidão por nos ter propiciado este momento de emoção ímpar.


O Criador me proporcionou outra inédita e generosa participação na Festa do Divino Espírito Santo. Era 2001. Em companhia de dezenas de servidores municipais, servimos a milhares de devotos o afogado – prato tradicional do evento, à base de carne e legumes. Foi uma noite memorável – a primeira de muitas que viriam nos anos seguintes. Deixo um agradecimento especial à Comissão Pró-Festa do Divino que nos brindou com a dádiva dessa experiência. Aliás, tão proativa que persiste, apesar da mudança no poder político-administrativo. Tornou-se uma espécie de tradição o prefeito e alguns colaboradores dedicarem uma noite à tarefa de servir o afogado.

Abro aqui um parênteses para contar um episódio interessante. A parte festiva do evento, inclusive o afogado, ocorria numa tímida área ao lado do Ginásio Municipal de Esportes. Não comportava os visitantes e não havia vagas para estacionamento, bloqueando o crescimento da Festa. A partir de 2002, resgatamos um imenso espaço que servia como “cemitério de carros” apreendidos por documentação irregular. Com infraestrutura adequada, o local tornou-se um polo de eventos ao lado do CIP – Centro de Iniciação Profissional.

Já em 2002, oferecemos à Associação Pró-Divino o novo espaço para realização de toda parte festiva, incluindo as dependências do CIP para garantir aos visitantes espaço apropriado para saborear o afogado. No segundo mandato à frente da Prefeitura, instalamos sanitários e completamos com a Avenida Cívica. Assim, acabava o martírio da falta de vagas para estacionamento.

Foi o nosso modo de dar o mínimo de retribuição, sob a forma de conforto e segurança, aos integrantes da Associação Pró-Divino e aos devotos, demonstrando nossa gratidão e colaborando para o desenvolvimento da Festa. Sabíamos que o público aumentaria ano após ano em ritmo acelerado.

A Festa do Divino Espírito Santo une religiosidade, cultura e tradição. Mas, não é só. Renova a fé, inspira a solidariedade e resgata valores éticos adormecidos. A perfeita conexão entre a beleza da forma e a nobreza do conteúdo está em tudo. No Império do Divino, nas procissões, no entusiasmo das voluntárias no café matinal, na nobre missão das rezadeiras, na Entrada dos Palmitos, em cada bandeira ostentada com orgulho. Está também no afogado, nos doces das “abelhinhas” e em tantos outros quitutes da quermesse – fruto da dedicação de fiéis que se transforma em benefícios para pessoas carentes. Diante de tantas dádivas, basta ter fé, participar e rogar ao Divino que derrame seus dons sobre a nossa Cidade, nosso Brasil e nossa gente.

São 11 dias de uma extensa programação que mexe com a Cidade e atrai milhares de visitantes de outros municípios, Estados e até do exterior. Alvoradas, novenas, missas, procissão que percorre as ruas bordadas com flores e cereais, todos os eventos são essenciais para nós, cristão católicos.

É uma festa de devoção que purifica a alma. Integrar o cortejo é como abraçar o Criador. E se permitir a uma indescritível sensação de paz, que clareia a mente para entender e assimilar o profundo significado dos sete dons do Espírito Santo. Vale conhecer cada um deles. O dom da Sabedoria nos mantém voltados para o bem. Com entendimento, aprendemos a buscar a verdade. A dádiva do Bom Conselho nos ajudar a escolher o melhor caminho. Já a Fortaleza é a coragem, a força para enfrentar as adversidades. Para compreender os sinais dos tempos, há o dom da Ciência. Com a Piedade, nutrimos a compaixão pelo próximo e a caridade. O sétimo dom é o Respeito a Deus, aos valores do amor e da bondade, que nos faz fugir de toda a maldade.

Com sinceridade, confesso que deixo muito a desejar na tradução do que a Festa do Divino representa para mim e minha família. Mas, precisava tentar escrever, compartilhar esta divina experiência. Exatamente por saber que me falta a capacidade e o talento dos grandes escritores, recorro à memória viva dos momentos em que conduzi a Bandeira do Divino. Com esta emoção mergulhada na alma e fazendo brotar lágrimas nos olhos, manifesto a mais profunda gratidão a Deus, ao Divino Espírito Santo, aos voluntários que tudo fazem pelo bem do próximo e a todas as pessoas maravilhosas que me permitiram viver experiências impagáveis ao longo das celebrações.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Vitrine do desenvolvimento real

Recém-lançado pelo governo paulista, o sistema digital criado para avaliar o potencial econômico das regiões do Estado mostra de maneira cristalina o quanto São Paulo é fascinante para empreendedores dos mais diversos segmentos. De dentro e de fora do País. Batizado de Potencialidades-SP, o estudo é uma vitrine virtual das cidades, onde o investidor encontra as localidades com as melhores condições para a atividade pretendida. Tudo rápido e objetivo, como um sistema on line deve ser. E confiável por sair de um fonte oficial.

Disponibilizado no site www.investe.sp.gov.br/potencialidades, o sistema possibilita ao empreendedor obter o cruzamento de dados entre seu ramo de atuação, as condições existentes, seus interesses sob diferentes aspectos e as localidades com melhor perfil para receber o investimento.



Para identificar quais são os municípios mais promissores ao desenvolvimento dos variados segmentos de negócios, o estudo leva em conta 100 fatores de atratividade estruturais. Desde infraestrutura logística e energética até incentivos fiscais, passando por disponibilidade de áreas, características de zoneamento, capital intelectual, concentração de público (polos comercial e educacional, por exemplo), recursos naturais e limitações ambientais, entre outros.

O sistema criado pelo Estado faz o marketing das cidades paulistas, multiplicando as possibilidades de atração de investimentos. Antes, cabia a cada município alardear suas potencialidades na expectativa de conquistar novos empreendimentos.

Na realidade, faz mais. O diagnóstico proporcionado ao empresariado também funciona como excelente pauta para os prefeitos. Eles podem direcionar esforços para elevar os indicadores de maior interesse na avaliação dos investidores e obter melhor performance no ranking de localidades chamarizes de novos negócios.

Vale lembrar que a expansão empresarial alavanca a qualidade de vida da população. É a partir do desenvolvimento que o município consegue recursos para investir mais e melhor em saúde, educação, segurança, infra-estrutura, transportes, obras, esportes, cultura, lazer, enfim, em todas as áreas. Isto, além de gerar empregos e renda.

Falo por experiência própria. Cheguei à Prefeitura de Mogi das Cruzes com o desafio de reconduzir a Cidade à trajetória de desenvolvimento. A expansão empresarial estava congelada. Não havia perspectivas de novos negócios nem ampliação dos existentes. Por tabela, a arrecadação de impostos permanecia engessada, deixando os cofres municipais à mingua. Paradoxalmente, a população crescia e, com ela, as demandas sociais, sem que o poder público esboçasse reação.

Diante do quadro, a missão tornou-se obsessão. Providência número um: implantar a Política Municipal de Desenvolvimento. Foi uma ferramenta crucial para alcançar as metas. Envolveu, entre outros itens, legislação específica para atrair empreendimentos e estimular a expansão dos existentes – com incentivos fiscais, doações de áreas a pequenas e médias empresas –, revisão no zoneamento, criação de núcleos industriais, adequação e implantação do Plano Diretor, fomento às microempresas, profissionalização do mercado informal, instalação da primeira unidade do Banco do Povo na Cidade que, durante anos, foi campeã estadual em número de contratos formalizados. Tudo, em sinergia com outras instituições públicas, entidades classistas e universidades.

Paralelamente, a Administração Municipal multiplicou a oferta de cursos gratuitos no CIP - Centro de Iniciação Profissional. Eram apenas dois cursos e 280 vagas, em 2000. Já em 2003, o número de cursos havia saltado para 55, com 2 mil formandos anuais. A Prefeitura também criou um Posto de Emprego e Qualificação para agilizar a oferta e colocação de mão-de-obra conforme as demandas dos empreendedores, além de viabilizar a instalação de uma Fatec, de uma Intec – Incubadora Tecnológica. Tais fatos proporcionaram a Mogi, em 2004, a instalação de dois call centers que, em seis meses, abriram 8 mil postos de trabalho – na maioria, com perfil de primeiro emprego.



A bateria de ações conjuntas fomentou o crescimento industrial, oxigenou comércio, impulsionou o setor de serviços e fortaleceu os agronegócios, consolidando posições de vanguarda da Cidade na produção de hortifrútis e flores. Mogi ganhou cerca de 8,2 mil empreendimentos, entre indústrias, prestadores de serviços e estabelecimentos comerciais. Desponta no Ministério do Trabalho como um dos municípios que mais geraram empregos no País, no período de 2001 a 2008. Foram cerca de 115 mil, entre diretos e indiretos.

Isso tudo ocorreu, apesar das rigorosas limitações ambientais existentes para preservar os recursos naturais do Município que integra o sistema produtor de água destinado ao abastecimento da Grande São Paulo.

Para dimensionar o saldo desse trabalho, basta dizer que Mogi – proporcionalmente à densidade populacional – tornou-se recordista na constituição, implantação e ampliação de empresas, além de figurar no ranking nacional das 100 mais dinâmicas, ser catalogada como uma das mais bem administradas do País, uma das mais promissoras para trabalhar e uma das melhores do Estado para morar.

Para completar, a Cidade conta com o Distrito Industrial do Taboão – o maior e único espaço disponível na Região Metropolitana para expansão empresarial. São mais de 12 milhões de metros quadrados (m²), o bastante para abrigar 100 empresas – com 100 mil m², cada uma, empregar 45 mil pessoas e garantir um extraordinário na receita tributária, injetando nos cofres públicos cifra anual de, no mínimo, R$ 100 milhões referentes a ICMS e outros impostos. Preservado para a finalidade do crescimento empresarial, continuará viabilizando a evolução dos negócios com qualidade de vida.

O surto de desenvolvimento foi o passaporte para avanços nos diferentes setores. E credenciou o município a receber verbas dos governos estadual e federal para outras obras fundamentais ao bem-estar do povo e à atração de empreendimentos. Foi o caso da instalação de uma nova Estação de Tratamento de Águas e Esgotos, incluindo o sistema para drástica redução do lançamento de dejetos in natura nos rios.

Todos estes fatores são considerados no Potencialidades-SP. Não por menos, Mogi está no elenco dos municípios paulistas que oferecem as condições mais favoráveis para instalação de novas empresas na Região Metropolitana de São Paulo. Apresenta maior potencialidade para investimentos em metade dos fatores de atratividade estruturais, estando habilitada ao desenvolvimento das principais atividades agrícolas, industriais e de serviços.

Digo isso com uma porção de orgulho. Deixando a modéstia de lado, me sinto parte do processo de resgate do desenvolvimento em Mogi. Claro, sem perder de vista que os investimentos para atender as justas demandas da sociedade dependem de muito esforço, planejamento criterioso e bons parceiros – no setor público, iniciativa privada e sociedade civil.

Portanto, tenho absoluta certeza de que centenas de cidades paulistas precisam apenas de gestão eficiente, Plano Diretor adequado – que nada mais é que o planejamento integrado – e representantes comprometidos com os anseios da população para fazer aflorar suas potencialidades. E despontar, como Mogi, no ranking das melhores para receber novos empreendimentos.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Por quê esqueceram a ferrovia?

Sob qualquer ponto de vista – econômico, político e militar - o sistema de transporte é, inquestionavelmente, a atividade mais importante no mundo.

É possível afirmar, em alto e bom som, que a melhor ou pior qualidade de vida está intrinsecamente ligada ao sistema de transporte.

Detalhar, minuciosamente, todos os aspectos que envolvem o sistema de transportes torna-se inviável pelo exíguo espaço e complexidade do tema. Mas, ouso fazer considerações fundamentais sobre as políticas públicas faltantes neste nosso Brasil continental. Tal deficiência traz gigantescos prejuízos à população.

Transporte ou transportar é o exercício de deslocar, pessoas, animais, produtos ou informações de um lugar para outro. E o elementar nos seres humanos é sempre e permanentemente aprimorar tudo o que está em nosso habitat. No caso específico dos meios de transporte, implica perseguir a rapidez, eficiência, custo baixo e qualidade.

Vejam os avanços fantásticos e, tempos atrás, inimagináveis no setor de comunicações. Aliás, em 1973 protagonizei a implantação de telefonia rural nos municípios de Mogi das Cruzes, Suzano, Biritiba Mirim e Guararema, por meio de sistema cooperativado, pioneiro no Brasil. Foi uma revolução tecnológica de comunicação no campo.

Em especial, nestas duas últimas décadas, o avanço tem sido extraordinário, com alta qualidade e custo cada vez menor. Recebemos e transmitimos informações para quem e onde quer que seja de modo instantâneo. As mudanças tecnológicas carreadas pela modernidade sacodem e colocam em xeque nossa capacidade de acompanhamento. Graças a Deus! Paradoxalmente, quando de trata dos meios de deslocamento para seres humanos, animais e produtos, o que se nota é um sono profundo ou, no máximo, uma lentidão inconcebível. Mais que contraste com a cristalina evolução de outros setores, a letargia que domina o sistema de transportes é uma afronta à população. É verdade que houve avanços, mas são tão minúsculos que em nada contribuem com as necessidades reais e prementes do País.


Há os seguintes meios de transportes: HIDROVIÁRIO – FERROVIÁRIO – RODOVIÁRIO – AEROVIÁRIO – DUTOVIÁRIO. Todos fundamentais por aumentar a competição no mercado, garantir a economia de escala na produção e reduzir os preços das mercadorias. Em que pesem as peculiaridades naturais de cada país, vale observar que, pela ordem, o meio de transporte mais barato é, indiscutivelmente, o hidroviário. Em segundo lugar, vem o ferroviário que custa quatro vezes menos que o rodoviário. Já o aeroviário é o mais caro.

Longe de mim pregar que só interessa ao Brasil o transporte hidroviário, porque é o mais barato. Afinal, concentrar os deslocamentos numa única modalidade é o cúmulo do contrassenso em razão de diferentes distâncias, características dos produtos, prazos e outros fatores.

O ideal é o modelo misto ou intermodal, que consiste na utilização planejada dos serviços integrados de mais de um modo de transporte, de acordo com as necessidades do mercado e peculiaridades da carga. Ou seja, ferro-rodoviário, ferro-hidroviário, ferro-aeroviário, ferro-dutoviário, rodo-aéreo, rodo-hidroviário, rodo-dutoviário, hidro-dutoviário, hidro-aéreo e aero-dutoviário.

No Brasil, as combinações de serviço integrado no transporte passam longe do interesse público. A realidade nacional está na contramão do desenvolvimento. Aqui, o modo rodoviário concentra 54% dos deslocamentos, enquanto o ferroviário detém parcos 21% e o hidroviário responde por apenas 17%. É um cenário de arrepiar qualquer técnico em logística.

Em outras grandes nações, as combinações são bem diferentes. Nos Estados Unidos, o modo rodoviário detém apenas 25%, o ferroviário lidera com 50% e os 25% restantes cabem ao hidroviário. No Canadá, são 13% por rodovias, 52% por trem e 35% pelas hidrovias. A Rússia opera com somente 4% pelo modo rodoviário, deixando 83% a cargo dos trens e 13% pelas hidrovias. Na França, pela ordem, a distribuição é assim: 28% (rodoviário), 55% (ferroviário) e 17% (hidroviário). A Alemanha segue a composição 18%, 53% e 29%.

É revoltante saber dessa triste realidade e angustia-me a impotência no enfrentamento da grave situação. Mas, omissão jamais. Como escreveu Joaquim Osório Duque Estrada na composição do Hino Nacional Brasileiro: “Verás que um filho teu não foge à luta”. Pinço a frase, com energia e orgulho, para batalhar de todas as formas e até a última instância com o objetivo de mudar os rumos do sistema de transporte neste País, buscando a utilização racional dos serviços integrados no deslocamento.

Vejam a situação insustentável da malha viária brasileira. Tem uma estrutura absurdamente desproporcional à frota de veículos, que cresce a cada dia com novos carros chegando às ruas. O resultado não poderia ser outro, senão o caótico congestionamento. Pior, o trem e o metrô não recebem a prioridade que merecem do Poder Público para serem melhores e mais eficientes a ponto de conquistarem a preferência dos passageiros. Quem anda de carro, amarga engarrafamentos, gastos e revolta. O usuário de ônibus sofre com os atrasos diários, acumula mau humor, indignação, tempo e descanso perdidos.


Quem planta soja em Mato Grosso, Goiás e outros rincões do País tem como aliados terra fértil e clima adequado. No entanto, paga muito mais caro por sementes, fertilizantes, defensivos e outros insumos. Tudo, por causa dos milhares de quilômetros que a carga viaja pelas rodovias. O impacto dos fretes exorbitantes não pára nas lavouras. Por falta de hidrovias e ferrovias, a safra colhida faz o caminho inverso a bordo de caminhões e todo dinheiro gasto neste vai e vem pelas estradas acaba indo para a conta do consumidor na hora em que ele compra o produto final.

Enquanto as autoridades constituídas, acomodadas em gabinetes com ar condicionado, não tomam as devidas providências, a população paga o pato. Consumidor, agricultor, industrial, comerciante, gente de todos os setores produtivos arca com custos cada vez maiores. Quando o empreendedor não suporta, vem a insolvência e, junto com ela, mais desemprego.

Repito: não é possível que os governantes desconheçam que o Brasil tem dimensão continental – ideal para ferrovias, há rios e mais rios – sob medida para hidrovias e a população urbana cresce geometricamente – digna de todo respeito.


A gloriosa história nacional dos transportes hidroviário e ferroviário remonta a 29 de maio de 1852, quando o empresário Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de Mauá, constituiu a Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis, no Estado de Rio de Janeiro. Em 12 de junho daquele ano, o Governo Imperial concedeu-lhe, por meio do Decreto nº 987, o direito de construção e exploração dos transportes hidro-ferroviário.

Durante quase um século, de 1852 a 1950, o incontestável desenvolvimento do Brasil – notadamente, no Estado de São Paulo – deve-se ao transporte ferroviário. As grandes cidades de hoje, com distância média de 400 a 600 quilômetros da Capital paulista, nasceram da implantação das famosas e históricas estradas de ferro: Mogiana. Sorocabana, Paulista e Rondon. Foi assim com Ribeirão Preto, Presidente Prudente, Marília e Araçatuba, entre outras. Maior que a saudade é o inconformismo com o total desmantelamento dessas linhas férreas.

É imprescindível mudar o quadro. Custe o que custar. Sobejamente, este Brasil é imbatível e invejável enquanto País, porém, num mundo globalizado, esses requisitos não bastam. Temos de protegê-lo com corpo, mente e alma, tirando sábio proveito das dádivas divinas que são as riquezas naturais.

Com empenho, convicção e mobilização popular, precisamos forçar novo direcionamento para investimentos que vêm dos impostos, portanto, do bolso do povo. É vital exigir a imediata prioridade na implantação de estradas de ferro para transporte de cargas e passageiros, como também de estruturas hidroviárias. Isto implica, paralelamente, reduzir a voracidade de grandes organizações que, mancomunadas com maus brasileiros travestidos de autoridades públicas, só pensam, planejam, agem e concretizam gigantescos projetos no sistema de transporte rodoviário. Só têm olhos para rodovias porque é onde faturam bilhões e bilhões de dólares para satisfazer os próprios interesses; não os do Brasil e muito menos os dos brasileiros.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Todas as Igrejas são de Deus

O ser humano vive em constante transformação. De forma imprevisível e irresponsável, acaba imputando vastos prejuízos à natureza, assim como deploráveis mutações ao próprio habitat. Não sou sociólogo, psiquiatra, ideólogo e, muito menos, guiado por alguma pretensão maior. Sequer, detenho conhecimentos mínimos sobre o campo da espiritualidade ou do mundo religioso. Porém, com muita humildade e respeito, vou me permitir discorrer sobre a necessária e importante religiosidade que cada um tem de cultivar e abraçar para o conforto espiritual, sempre com fé inquebrantável em Deus. É deste exercício permanente que nascem os sentimentos de solidariedade, de amizade e de amor ao próximo.

Convenço-me, cada vez mais, da grande missão que deve, espontaneamente, brotar da alma para rechaçar o preconceito, a discriminação e outros desprezíveis pensamentos similares. E, desta maneira, admitir, respeitar e valorizar a diversidade entre pessoas e povos, aceitando-a com naturalidade. Mais que isso. Entendendo que Deus fez assim, por absoluta necessidade de o ser humano viver em sociedade, de depender um do outro, porque como resume a famosa citação de autoria desconhecida, “somos anjos de uma asa só, precisamos nos abraçar para alçar vôo”.

Constata-se na história que, desde quando mundo é mundo, a sede desmedida pelo poder – prima-irmã da possessividade, egocentrismo, vaidades fúteis e outros sentimentos indignos –, associada à pseudo-inteligência ou ilusão de sabedoria, tem deflagrado sucessivos desentendimentos na humanidade. Os conflitos surgem de atos e fatos banais, insignificantes, sem nexo, pequeninos mesmo, como a divergência de opiniões sobre a cor de um vestido, preferências diferentes por times de futebol, uma mínima falha cometida no trânsito ou o latido de um cão no vizinho. Nutridas por mágoa, ressentimento, inveja, ciúme, raiva, ódio e afins, as discórdias ganham proporções descabidas e resultam em ações inimagináveis, porém, concretas, de violência. Basta dizer de crianças, inclusive bebês, assassinadas friamente pelos próprios pais, de explosivos detonando milhares de vidas durante atentados terroristas, da proliferação de gente-bomba (homens e mulheres) com a missão morrer para matar e do derramamento de sangue nas guerras, entre tantas outras mostras de horror.

Nada justifica a violência. De xingamentos a confrontos físicos, chegando ao extremo das guerras, tudo isto é abominável. Mais execrável ainda é que inúmeros crimes sejam praticados por seres deste Planeta Terra em nome de diferentes credos e religiões. Pior, sejam incitados e planejados por uma escória que se julga líder espiritual e supremo exemplo de devoção.


As guerras religiosas dominaram o cenário mundial desde a Idade Média. A mais célebre foram As Cruzadas (nove, segundo a tradição) – cerca de dois séculos de batalhas entre cristãos e muçulmanos, que deixaram milhões de mortos e um rastro de destruição. No século XVI, conflitos entre católicos e protestantes devastaram a França e se alastraram por toda Europa. São amostras dos infindáveis registros de combates motivados por preferências religiosas. As tropas irrompiam da sociedade. Nunca faltaram pessoas para acreditar nas aberrações usadas como justificativas às ambições econômicas e geopolíticas dos agressivos grupos no poder em vários pontos do mundo.

Essas atrocidades ultrapassam nossa capacidade de entendimento. São fatos inexplicáveis. Torturar, saquear, estuprar, matar em nome de Deus? Não. Deus é um péssimo argumento para a sucessão de agressões insanas carreadas por fundamentalismos religiosos.

O mais alarmante é que os desentendimentos não se esgotaram nos dias atuais. Ao contrario, dão sinais de recrudescimento em várias partes do mundo. Inclusive, entre povos do mesmo país. Lamentavelmente, a concorrência entre grupos religiosos ainda é visível e palpável. Em meu modesto entendimento, ancoram-se em obsessão por poder, ganância, demonstração de força ou coisa que o valha.

Como exemplo, vou pinçar Mogi das Cruzes – já que fatos similares se repetem em todos os quadrantes do Brasil e do mundo; evidentemente, com maior ou menor intensidade. Em 2001, quando, honrosamente, começei a administrar o Município, fui procurado por inúmeros pastores de Igrejas Evangélicas. Denunciavam que recebiam tratamento desigual em relação às Igrejas Católicas, apesar de todas serem cristãs. Referiam-se à fiscalização da Lei do Silêncio, concessões na cobrança do IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano e a falta de perspectiva de apoio municipal ao, então, projeto “Marcha para Jesus”, entre outras situações interpretadas como discriminatórias pelas lideranças evangélicas.

Pois bem, os parâmetros de Justiça foram restabelecidos. Havia, sim, atitudes preconceituosas por parte de alguns fiscais da Lei do Silêncio. A legislação municipal estabelece critérios, em limites de decibéis, para o nível de ruídos e barulhos detectados na celebração de cultos em templos, igrejas e áreas públicas abertas – alvo das maiores reclamações. Com relação ao IPTU, por meio de disposições legais, praticamente todas as igrejas evangélicas receberam isenção tributária.


Os católicos mogianos costumam dizer que a parte festiva da Festa do Divino Espírito Santo de Mogi das Cruzes ganhou dimensão fantástica somente após 2001 quando, à frente da Administração, assumi a responsabilidade pelo apoio logístico integral ao evento. Bispos, padres e líderes católicos relatam que esse crescimento alavancou, valorizou e ampliou significativamente o número de fiéis, na acepção da palavra. Aliás, modéstia à parte, a contribuição foi além, com a instalação do Sub-Império do Divino na sede da Prefeitura.

Vale ressaltar que cheguei à Administração Municipal com o firme propósito de ter a efetiva e permanente participação e parceria dos seguidores de todas as religiões. E a gestão foi recompensada, visto que as políticas públicas nas diferentes áreas tiveram êxito.


Assim, legítimo e mais do que justo que a Prefeitura oferecesse igual apoio às Igrejas Evangélicas para realização da “Marcha para Jesus”. O primeiro grande evento ocorreu em 2002 e, graças a Deus, a cada ano que passa, mais fiéis e devotos registram participação.

Sou cristão, sou católico, mas confesso que deixo muito a desejar como verdadeiro praticante da minha religião. Entretanto, tenho fé inquebrantável em Deus e faço tudo com amor e desprendimento. Na verdade, me julgo premiado por Ele. Tenho obtido tudo o que poderia esperar da vida – família unida, saúde, amigos, paz de espírito, muito amor para dar, enfim, sou uma pessoa feliz e super agradecida.

Mesmo católico, jamais esquecerei os fabulosos ensinamentos conceituais, filosóficos e de princípios do Budismo. Foi a religião dos meus avós, imigrantes japoneses que, em grande parte, moldaram minha alma e me possibilitam cumprir os desafios da missão de ser um cidadão brasileiro.

Cresci com o budismo, aderi ao catolicismo e, no cotidiano, aprendo muito com evangélicos, espíritas e seguidores de outros credos sobre o imprescindível valor da religião em nossa vida. E, assim, ganho mais força para lutar sempre pelo respeito à diversidade em todos os sentidos e pela valorização das divinas diferenças entre os seres humanos. Afinal, estas são as regras sabiamente criadas pelo Senhor.

Em razão de todos esses fatos, não posso compactuar com preconceitos e discriminações que geram discórdias de impensáveis proporções na humanidade. Defensor irrestrito do papel indispensável da religião na vida do ser humano, sou integralmente contra a desnecessária, ilegítima, inoportuna e tão prejudicial concorrência entre as igrejas de credos diferentes.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes