quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Legado dos Jogos Olímpicos

Foram duas semanas de emoção intensa e diversificada. Torcemos demais, rimos, choramos de alegria com as conquistas, sofremos com as derrotas, nos surpreendemos com feitos extraordinários, nos indignamos com a farsa ultrajante do arremedo de atleta ianque, nos solidarizamos com gente desconhecida que arrebatou espaço em nossos corações, festejamos velhos conhecidos que justificaram sua fama e nos orgulhamos, muito mesmo, dos espetáculos produzidos pelo Brasil para deleite de 4 bilhões de pessoas. Com talento natural, dinheiro minguado, muita criatividade e o trabalho descomunal de voluntários. Acabaram os Jogos Olímpicos Rio-2016. O que fica?

Mais do que memórias maravilhosas e as medalhas arrebanhadas – incluindo as inéditas em nossa história–, as Olimpíadas deixam um legado fabuloso. Resta-nos saber aproveitá-lo. Como humanos, cidadãos e como Nação. Os Jogos, em si, são fonte de conhecimento. Proporcionam a oportunidade de conhecer esportes que a maioria das pessoas nunca havia visto, diferente de outros mundiais que focam uma modalidade esportiva. Porém, o que marcam são as histórias.

Falo da judoca Rafaela Silva que faturou o primeiro ouro brasileiro nos Jogos. Menina pobre da Cidade de Deus que, não fosse o esporte, poderia ter um destino triste, similar ao de seus amigos presos por tráfico de drogas ou mortos em confrontos com a polícia. Ou do pugilista baiano Robson Conceição, também dourado, que usa seu talento para ensinar crianças carentes da sua comunidade. Ou ainda de Thiago Braz e seu salto de ouro, à frente do drama de ter sido abandonado pela mãe ainda criança e criado pelos avós.

O que dizer, então, de outro menino pobre, também baiano, que quase morreu por queimaduras, foi sequestrado e resgatado, perdeu um rim na traquinagem e levou a canoagem brasileira a um nível nunca imaginado? Isaquias Queiroz, vencedor de três medalhas, quase não chega onde chegou. Tinha de ajudar no sustento da casa e teria largado o esporte, se não fosse a contribuição financeira de gente que acreditou nele. Outro herói improvável é o ex-pedreiro e ex-garçom que deu ao Brasil o bronze inédito no taekwondo, categoria acima de 80 kg: Maicon Siqueira, o mineiro raçudo. 

Todos eles encontraram no esporte o caminho da superação. Das dificuldades, das limitações, dos próprios sonhos. Pinço ainda o exemplo de Serginho, o maior líbero de todos os tempos e, aos 40 anos, um guardião do time de ouro do vôlei masculino. Foi o menino pobre que levou uma nova linguagem ao então esporte de elite. Ele vendia geladinho em campos de várzea, chorou por falta de dinheiro, mas manteve o foco e a fé, sem nunca deixar de valorizar as origens e resguardar sua simplicidade. Comprou a casa prometida à mãe. Também optou por bancar uma cozinha planejada para ela em vez de um carro para si mesmo. Eis uma bela lição de amor à família, de gratidão aos pais. Assim foi com outros medalhistas que galgaram espaço no pódio com incomensurável dedicação. “Caí de bunda, caí de cara e, na terceira Olimpíada, eu caí de pé”, resumiu o ginasta da prata Diego Hypolito. Muitos mais acalentaram nossa alma verde e amarela.

Extasiados, assistimos às façanhas do lendário e carismático Usain Bolt, o raio da pequena e pobre Jamaica, a saga de Michael Phelps nas piscinas, os movimentos precisos da espetacular Simone Biles na ginástica. Vimos também que, acima das competições, deve prevalecer a natureza humana. E ela tem de ser boa. Foi assim que a neozelandesa Nikki Hamblin parou para socorrer a americana Abbey D’Agostino, vítima de acidente durante a corrida de 5 mil metros. Eis a vitória do companheirismo, da amizade, do desprendimento e amor que o esporte também ensina.

O apelo à paz mundial foi protagonizado pelo abraço fraternal entre o britânico Andy Murray e o argentino Juan Martín Del Potro na final de tênis. Enquanto as torcidas disparavam ofensas mútuas em alusão à guerra entre os dois países, em 1982, pela posse oficial das Ilhas Malvinas, os tenistas choravam, abraçados, por longo período, ao final da exaustiva peleja. Murray ficou com o ouro. Mas, isso era menos importante que o recado. 

Entendo que é de todos a luta contra as desigualdades e intolerâncias de toda ordem. Ocorre que o esporte tem o condão de imprimir essa marca na alma humana. Apesar de todas as mazelas que ainda estão dissipadas no mundo e, no Brasil, em especial, a tocha olímpica deixou um rastro de esperança. Ao passar a bola para Tóquio, particularmente para as mãos do meu xará, o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, a Nação brasileira tem motivos para cultivar novos sonhos.

Penso em muito mais que medalhas. Gostaria que as histórias de superação dos nossos atletas servissem para inspirar outros brasileirinhos. E para mover governantes a investir, de fato, na oferta de esportes às crianças e adolescentes. Não é só uma questão de pódio nem de evolução no desempenho olímpico. No campo do desenvolvimento humano e social, o esporte se apresenta como ferramenta indispensável à promoção da cidadania. É ainda uma poderosa vacina contra os males da ociosidade que favorecem a escalada da violência. 

Não falo só do esporte competitivo. Mas sim, do esporte associado ao lazer, de modo abrangente e acessível. Por décadas a fio, a maioria dos municípios deu pouca importância a essas atividades. Inclusive Mogi das Cruzes que, até o ano 2000, envolvia menos de 10 mil mogianos num único projeto municipal da área. 

Com o propósito de reverter esse quadro, assumimos a Prefeitura em 2001, lançando os primeiros programas da série para estimular práticas desportivas e oferecer lazer. Em 2008, quando deixamos o cargo, os dez principais projetos esportivos – sem incluir os de recreação – registravam média anual superior a 130 mil atendimentos. Foram moldados para beneficiar pessoas de todas as idades. 

É o caso do Esporte Mogi, desenvolvido em parceria com a iniciativa privada, para levar atividades esportivas, noções de ética e cidadania às crianças de bairros carentes da Cidade. Com total receptividade popular, o projeto realizava nada menos que 5,5 mil atendimentos por ano. Ou ainda do “Sanção Premial”, que garante isenção do IPTU para clubes que oferecem práticas esportivas e recreativas gratuitas a alunos das escolas municipais. Já revelou talentos para o esporte profissional até em outros países.

As revelações do esporte mogiano personificam a evolução do processo que regeu a política municipal adotada para o setor. Todas as ações foram focadas no social. Ou seja, associar prática de esportes e lazer para proporcionar ocupação saudável à população, com prioridade para crianças e adolescentes carentes – combatendo a ociosidade que facilita a rota da violência e das drogas – e para Terceira Idade. Sintetiza a filosofia definida junto com o povo, no PGP – Plano de Governo Participativo. 

Mantidas pelo meu sucessor, Marco Bertaiolli (PSD), as aulas de esportes – de iniciação à formação de atletas – são ministradas nos centros esportivos, em clubes privados e escolas municipais, reforçadas pelo período integral. Há dezenas de modalidades – de futebol a badmington, passando por rugby, xadrez, judô, taekwondo, ginástica artística e atividades para Terceira Idade. Sem contar a recreação. Muita recreação.

O lazer é a mola mestra de um dos mais bem-sucedidos projetos de todos os tempos. A Rua Feliz tem 13 anos de existência – 5,5 anos deles em nossas duas gestões como prefeito, agregando mais de 450 mil atendimentos. Percorre a Cidade nos finais de semana, levando brinquedos, atrações musicais e atividades esportivas. 

"Que venha Tóquio, Shinzo Abe! Que venham
dias sempre melhores, Brasil!"
O povo conhece bem o poder dessas ferramentas. Guardadas as proporções, orquestram magia semelhante à dos tempos de Olimpíadas, que vestem os corações brasileiros de verde e amarelo e criam uma linguagem única, capaz de nivelar desigualdades em nome da vitória. 

Envolvida com esportes e lazer, a comunidade exercita a cidadania e cultiva a integração social. Corpo em dia e mente sã em nome de bens maiores, como mais qualidade de vida e menos violência. Nesse campeonato, se joga todo dia. Os craques são os participantes dos projetos. Nada de mitos. Há gente comum cumprindo seu papel. E isso faz toda a diferença na estrada onde a única derrota é a desistência. Que venha Tóquio, Shinzo Abe! Que venham dias sempre melhores, Brasil!

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Longe da idolatria

Mogi das Cruzes recebeu o cineasta e jornalista Arnaldo Jabor para uma palestra sobre o cenário político e econômico do Brasil. Valeu pela exposição nua e crua do sistema político brasileiro, falido desde que herdamos o modelo português baseado no patrimonialismo. Trata-se daquele em que pessoas tomam de assalto o poder e, em nome do Estado, fazem o diabo com as riquezas do País. Usufruindo de polpudos recursos financeiros surrupiados da população massacrada com infindáveis impostos, agem sob o manto de regimes ditatoriais ou travestidos de democráticos. Educação, saúde, segurança, habitação, saneamento básico, infraestrutura, promoção humana e etc que se lasquem. Aliás, que se lasque o povo! Esta é a tônica do mantra ainda não silenciado.

O evento foi promovido pelo Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) no Alto Tietê, em comemoração aos seus 55 anos. Como contemporâneos, eu e Jabor vivemos períodos idênticos do País. Claro, o conhecimento e a visão dele são mais profundos, porque é jornalista e conviveu diretamente com os homens do poder. De toda forma, compartilhamos da avaliação sobre as necessidades da Nação, assim como da admiração pelo trabalho do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC). 

Num breve retrospecto, Jabor passou pelas personalidades que governaram o País desde Getúlio Vargas – um mix de ditador, populista e faces democráticas –, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart, da era democrática, Castelo Branco, Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo – regime militar e ditadura – até os da fase democrática mais recente: José Sarney (que assumiu porque Tancredo Neves morreu antes de tomar posse), Fernando Collor, Itamar Franco, FHC, Lula e Dilma Rousseff. 

Diferentemente dos EUA, o Brasil sofre as mazelas do colonialismo, paternalismo e patrimonialismo – herança maldita do modelo secular português. Assim, os espertalhões da classe dominante tomam conta do poder e, por demagogia ou populismo, perpetuam-se nele. Não importa se o regime é ditatorial ou democrático. A meta é a mesma: criar e adotar estratégias para o enriquecimento pessoal ou do seu grupo. Para eles, a educação não pode ter qualidade. Quanto mais analfabeto e sem cultura for o rebanho, mais fácil de ser controlado.

Nesse panorama, concordo com Jabor quando ele destaca duas personalidades que, enquanto exerceram a Presidência da República, atuaram como estadistas e não como patrimonialistas. Um foi Itamar Franco – substituto do cassado Collor que iludiu a maioria dos brasileiros e continua firme neste mister –, que teve o mérito de nomear Fernando Henrique Cardoso ministro da Fazenda, responsável pela salvação econômica e social do Brasil a partir do Plano Real. O outro foi o próprio FHC que estabeleceu as bases para o desenvolvimento sustentável da Nação. Diga-se de passagem, um avanço que seria eliminado pelos seus sucessores. 

Ao descrever a atuação de FHC, Jabor deixou de citar dois pontos que considero fundamentais. Foi na gestão dele que surgiu o instrumento essencial ao suporte das ações para estabilização econômica: a Lei de Responsabilidade Fiscal, que colocou os governos – nas três esferas de Poder – sob austera vigilância para o cumprimento do equilíbrio orçamentário, fiscal e financeiro. Também merece destaque o desempenho da sua esposa, a socióloga Ruth Cardoso, na implantação de programas de verdadeira promoção social, sem paternalismo barato. 

Nas palavras de Jabor, a eleição de Lula, em 2002, foi o pior desastre político do século. Bateu o recorde histórico da corrupção, com a ajuda de José Dirceu, Antonio Palocci, Marcos Valério, Delúbio Soares e outros da sua volumosa corriola. Já Roberto Jefferson, apesar de corrupto, teve a decência de delatar os mensaleiros – pena que livrou o chefão! 

Na visão de Jabor – com a qual corroboro –, Lula se aproveitou da baixa condição socioeducativa e cultural do povo brasileiro. Enganou a população com demagogia e gastou o dinheiro que o País não tinha em ações clientelistas. Forjou-se como ídolo e vendeu ao mundo inteiro a autoimagem de salvador dos pobres. Ao mesmo tempo, alardeou ter alcançado a melhor gestão pública da história com o crescimento do PIB de 5% a 7%. Longe dos holofotes, inchou a máquina administrativa e levou os cofres públicos à míngua. 

Mestre na arte de criar e vender ilusões, Lula ludibriou a população brasileira, governantes estrangeiros e líderes mundiais. Fez mais. Elegeu centenas de postes como prefeitos – inclusive Fernando Haddad, da maior cidade da América Latina –, muitos governadores, como Jaques Wagner, ex da Bahia, e até a presidente Dilma Rousseff. Esta última reeleita e na mira da cassação por malfeitos. 

A avassaladora multicrises nacional será um instrumento de modernização. A expectativa é a de que sirva para sepultar o modelo ultrapassado de demagogia e corrupção que engole todos os setores da sociedade. Assim como Jabor, estou otimista. Também não vejo o interino Michel Temer como solução. Entretanto, é a faísca de esperança para começar a reversão do quadro atual. 
"Os cidadãos de bem dispensam a idolatria vã."

Contudo, o único motor capaz de mover as engrenagens da retomada do crescimento econômico-social é o povo brasileiro. Mais do que nunca, a população precisa ser responsável, assumindo seu papel de recuperar o que lhe pertence: a Nação. Paralelamente, tem de ficar imune ao canto das sereias espertalhonas que, por interesse próprio, travestem-se de pseudossalvadores para permanecerem no poder e viverem às custas dos brasileiros. O Brasil não carece de autoproclamados heróis. O arsenal histórico já está repleto de gente assim, mais tarde identificada como vilã. Os cidadãos de bem dispensam a idolatria vã. Têm de fiscalizar, protestar, lutar contra a corrupção e os desmandos. Vamos todos nos empoderar e resgatar o País. O momento é agora! Valeu a palestra, Jabor!

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Proteção à mulher

Muitas sofrem sucessivos ataques e não se dão conta da gravidade do abuso que sofrem. É o caso do marido, namorado, do companheiro que as depreciam rotineiramente. Dizem que são feias, gordas, burras... Outras apanham uma, duas, dez, inúmeras vezes. Há aquelas que são violentadas, torturadas, passam por todo tipo de privação e têm até os corpos mutilados ou incendiados. Em 77% das ocorrências, as agressões ocorrem na frente dos filhos, podendo afetar-lhes a personalidade e transformá-los nos agressores de amanhã. Nada menos que 11 mulheres por dia não sobrevivem para contar sua história de violência doméstica. São as vítimas do feminicídio que, em mais de um terço dos casos, perderam a vida nas mãos de parceiros e ex-parceiros. Este é o panorama que faz do Brasil o quinto país mais violento para as mulheres num ranking de 83 avaliados pela Organização Mundial de Saúde. 

Essa ainda é a realidade em 2016, quando a Lei Maria da Penha completou dez anos. Sancionada em 7 de agosto de 2006 e em vigor desde setembro daquele ano, a norma estabeleceu que é crime a violência doméstica – física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral. Ao lado da Lei do Feminicídio, é um importante instrumento para proteger as mulheres. Contudo, falta fiscalização no cumprimento da legislação e das medidas protetivas concedidas pela Justiça que, entre outras ações, podem proibir o homem de se aproximar da mulher ou afastá-lo do lar. Outro empecilho gigante é a lentidão do Judiciário até para determinar ações de proteção. A demora só intensifica o entendimento de que o malfeitor acaba impune.

Não é só. Apesar do aumento das denúncias às autoridades, até como efeito da divulgação de casos horrendos e de abusos sofridos por celebridades como a atriz Luiza Brunet, as estatísticas demonstram que pelo menos oito em cada dez mulheres sofrem caladas. Omitem as agressões e, pior, continuam apanhando e podem ser as próximas vítimas fatais.

Por que a vítima não denuncia o agressor? Por muitos fatores. Desinformação, acesso difícil aos órgãos de proteção à mulher, medo de represálias e castigos piores, vergonha de se expor, dependência econômica e psicológica etc. Ainda impera, sim, o conceito equivocado de que o detrator põe comida em casa e é um bom pai, apesar das agressões. Público feminino: nenhum homem capaz de agredir uma mulher, fisicamente ou mesmo com palavras, é bom! É um traste, um lixo humano! Precisa ser denunciado e punido de forma exemplar!
"Nenhum homem capaz de agredir uma mulher é bom! É um traste,
lixo humano! Precisa ser denunciado e punido de forma exemplar!"

Evidente que o poder público tem de amparar a mulher que denuncia. Ela precisa de fácil acesso à rede de proteção, da rápida atuação da Justiça para afastar o agressor e de um eficaz sistema de fiscalização. Ao mesmo tempo, tem de contar com suporte para si mesma e para os filhos, caso tenha necessidade de acolhida imediata, com segurança e alimentação.

É dever do poder público garantir o acesso à rede de proteção feminina. O assunto sempre esteve entre minhas prioridades na vida pública. Enquanto deputado estadual, por exemplo, participei ativamente das ações para viabilizar a instalação da Delegacia de Polícia de Defesa da Mulher em Mogi das Cruzes, efetivada em 8 de julho de 1991. Como prefeito, acolhi as solicitações das autoridades de segurança pública do Estado para, com recursos do orçamento municipal, concretizar o novo prédio da unidade, inaugurado em 18 de abril de 2006 no Parque Monte Líbano, onde está até hoje. Até o ano passado, era a única existente na Região do Alto Tietê.

Em 2005, também antes da vigência da Lei Maria da Penha, havíamos criado o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (Commulher), encarregado de desenvolver ações voltadas à melhoria das condições de vida das mulheres e eliminação de todas as formas de discriminação e violência contra o público feminino, garantindo sua plena participação e igualdade nos planos político, econômico, social, cultural e jurídico. De forma oficial, organizada e efetiva, a medida veio para somar a outros programas inéditos que implantamos no sentido de atender às necessidades da população feminina. Pinço como exemplo o Pró-Mulher, clínica médica especializada na assistência às mulheres que impôs dignidade no tratamento. 

Ainda enquanto prefeito, viabilizamos o convênio com a Ong Recomeçar que recebia subvenção municipal para manter uma casa abrigo secreta. Com capacidade para atendimento de 20 mulheres, o local, mantido em sigilo, acolhia vítimas que, na avaliação da Justiça, corriam risco de morrer. Ou ainda, aquelas que viviam como reféns do medo de seus algozes, sem ter para onde ir nem meios de se sustentar. 

Ao longo dos anos, houve avanços na Cidade. Mas, ainda falta um bocado para suprir as carências que fortaleçam a rede de proteção à mulher. Um trabalho importante é a chamada Ronda Maria da Penha que foi incorporada ao Projeto de Lei da Guarda Municipal Armada por iniciativa do meu filho, vereador Juliano Abe (PSD). Ao mesmo tempo, ele cobra do governo federal a liberação de recursos direcionados à implementação e aperfeiçoamento de serviços especializados de atendimento à mulher em situação de violência, incluindo o reforço da fiscalização para respaldar o cumprimento de medidas protetivas determinadas pela Justiça. A pedido dele, a deputada federal Keiko Ota (PSB) apresentou as emendas ao Orçamento Geral da União.

Essas ações desenvolvidas em Mogi objetivam assegurar à mulher agredida todo o amparo de que ela precisa para superar o drama e seguir adiante sem ficar a mercê de novos ataques. Nessa linha de raciocínio, classifico como fundamental – e urgente – a implantação de Centros de Referência às Mulheres em Situação de Violência (CRM) para oferecer atendimento psicológico, social e jurídico. Defendo unidades com funcionamento 24 horas nos Distritos de Braz Cubas, Jundiapeba, César de Souza e no Centro. Com todas as ferramentas funcionando e a conscientização de que toda agressão precisa ser denunciada, começaremos a reverter o triste quadro de País da violência contra a mulher. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Ciência no combate à fome

Muita gente que assistiu à edição mais recente do reality show culinário MasterChef Brasil pode ter ficado surpresa com o desafio de preparar pratos usando plantas que a maioria costuma ver como mato. Foi um bom estímulo para a revisão de conceitos. Taioba, serralha, ora-pro-nóbis, araruta, vinagreira, mangarito, jacatupé, peixinho, azedinha, lírio do brejo, hibisco e tiririca entre outras, são alimentos nutritivos e até medicinais. 

Há 795 milhões de habitantes passando fome no planeta. No Brasil, cerca de 6% da população sofrem de desnutrição, o que representa 12 milhões de pessoas. Em 2050, o mundo terá 9,5 bilhões de moradores, o que demanda um aumento de 60% na produção de alimentos. Os dados da Organização Mundial para Agricultura e Alimentação (FAO) comprovam que ciência e vontade política, livres de tabus e preconceitos, precisam caminhar juntas para evitar que a humanidade sucumba por falta de comida. 

O atendimento à demanda projetada por alimentos depende de elevar a produção mundial para 22 bilhões de aves, 1 bilhão de porcos, 1,6 bilhão de bovinos e búfalos, 2 bilhões de ovelhas e cabras. O setor está sob pressão para melhorar suas técnicas de produção e seus métodos de alimentação desses animais, visando a produção em larga escala sem comprometer a sustentabilidade do planeta.

Também é vital expandir os resultados das culturas de extensão como soja, arroz, trigo, feijão, milho etc. O Brasil alcança, no máximo, metade da produtividade por hectare obtida em países como EUA e China. Lá, produzem 10 toneladas de trigo por hectare. Aqui, cinco.

Mas, não são apenas as grandes culturas que merecem atenção. É fundamental destacar a dieta equilibrada com a participação de hortaliças – inclusive as tradicionais focadas no reality show culinário – e frutas. São produtos que combatem doenças cardiovasculares, diabetes, úlcera, colesterol ruim e câncer entre outras. Daí a importância de cinturões verdes como o de Mogi das Cruzes e Região. É onde impera a policultura em pequenas propriedades altamente produtivas, com aplicação de tecnologia de ponta.

Dar cabo da necessidade cada vez maior de comida é uma missão que só será cumprida com atitude plural. Otimizar a produção de alimentos requer esforço interdisciplinar e multidisciplinar, envolvendo, entre tantas iniciativas, o aprimoramento de pesquisas genéticas. Falo de fortes investimentos em pesquisas e uso de altíssima tecnologia para melhorar a produtividade e recuperar áreas degradadas – 36 milhões de hectares no Brasil. No mundo inteiro, quase inexistem áreas virgens para cultivo. 

Enquanto a ciência é vital no processo, dá desespero de ver as maiores instituições de pesquisa no País agonizando por falta de investimentos. É o caso da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Em São Paulo, o renomado Instituto Agronômico de Campinas (IAC) está sucateado há mais de 30 anos. Refletem o fato de os governantes só investirem em iniciativas visíveis em curtíssimo prazo. Ou seja, com retorno que apareça durante o exercício dos seus mandatos. 

Além de elevar a quantidade e qualidade dos produtos, há mais medidas imprescindíveis. É preciso reduzir as perdas no trajeto entre o produtor e o consumidor, que alcançam 30%, no caso de perecíveis como os hortifrútis. Outro gargalo imenso reside na comercialização, ainda ancorada num retrocesso imperdoável por conta do desprezo governamental. Basta citar as Ceasas. Além de serem estruturas ultrapassadas, viraram quase proibitivas para quem cultiva itens perecíveis. Nos grandes centros urbanos, pululam proibições de tráfego de caminhões, num manifesto de total insensibilidade com os produtores e com a mercadoria perecível. 

Para alavancar a produção agrícola, o Brasil também carece desesperadamente de sintonia perfeita entre pesquisa, assistência técnica e extensão rural para capacitação profissional. Mas, não é só. O setor precisa receber a devida atenção. Falo da revisão da logística de transporte para privilegiar o uso de ferrovias em vez de rodovias, da manutenção de estradas rurais, de financiamentos acessíveis, de seguro rural que seja bom para o produtor e não para os bancos. Falo também de estruturas adequadas de eletrificação, telefonia e acesso à internet. Falo ainda de remover os gargalos na comercialização e reduzir a tributação sobre propriedade rural, veículos, equipamentos, insumos e produção. São medidas fundamentais para aumentar a produtividade (produzir muito mais numa área com a mesma dimensão), baixar preços, elevar a qualidade e a oferta de alimentos. 

"Haverá conflitos muito mais agudos do que os do Oriente Médio.
Aparentemente, pela guerra. Numa reflexão mais profunda, por fome."
Apesar não estar no desempenho de função pública, tenho orgulho de continuar líder rural. Defendo o setor não por ser produtor. Mas, por entender a vocação deste País para o agronegócio. Luto junto aos políticos e governantes desinformados para que enxerguem o campo, além dos cobiçados votos das cidades. 

Se a atividade produtora de alimentos, principalmente a cadeia de hortifrutigranjeiros – onde se concentram os relegados míni, pequenos e médios produtores –, não receber a legítima e merecida atenção, a população mundial será a grande sacrificada. Sem querer ser o mensageiro do apocalipse, digo que haverá conflitos muito mais agudos do que aqueles que massacram o Oriente Médio. Aparentemente, pela guerra. Porém, numa reflexão mais profunda, por fome.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)