quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Longe da idolatria

Mogi das Cruzes recebeu o cineasta e jornalista Arnaldo Jabor para uma palestra sobre o cenário político e econômico do Brasil. Valeu pela exposição nua e crua do sistema político brasileiro, falido desde que herdamos o modelo português baseado no patrimonialismo. Trata-se daquele em que pessoas tomam de assalto o poder e, em nome do Estado, fazem o diabo com as riquezas do País. Usufruindo de polpudos recursos financeiros surrupiados da população massacrada com infindáveis impostos, agem sob o manto de regimes ditatoriais ou travestidos de democráticos. Educação, saúde, segurança, habitação, saneamento básico, infraestrutura, promoção humana e etc que se lasquem. Aliás, que se lasque o povo! Esta é a tônica do mantra ainda não silenciado.

O evento foi promovido pelo Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) no Alto Tietê, em comemoração aos seus 55 anos. Como contemporâneos, eu e Jabor vivemos períodos idênticos do País. Claro, o conhecimento e a visão dele são mais profundos, porque é jornalista e conviveu diretamente com os homens do poder. De toda forma, compartilhamos da avaliação sobre as necessidades da Nação, assim como da admiração pelo trabalho do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC). 

Num breve retrospecto, Jabor passou pelas personalidades que governaram o País desde Getúlio Vargas – um mix de ditador, populista e faces democráticas –, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart, da era democrática, Castelo Branco, Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo – regime militar e ditadura – até os da fase democrática mais recente: José Sarney (que assumiu porque Tancredo Neves morreu antes de tomar posse), Fernando Collor, Itamar Franco, FHC, Lula e Dilma Rousseff. 

Diferentemente dos EUA, o Brasil sofre as mazelas do colonialismo, paternalismo e patrimonialismo – herança maldita do modelo secular português. Assim, os espertalhões da classe dominante tomam conta do poder e, por demagogia ou populismo, perpetuam-se nele. Não importa se o regime é ditatorial ou democrático. A meta é a mesma: criar e adotar estratégias para o enriquecimento pessoal ou do seu grupo. Para eles, a educação não pode ter qualidade. Quanto mais analfabeto e sem cultura for o rebanho, mais fácil de ser controlado.

Nesse panorama, concordo com Jabor quando ele destaca duas personalidades que, enquanto exerceram a Presidência da República, atuaram como estadistas e não como patrimonialistas. Um foi Itamar Franco – substituto do cassado Collor que iludiu a maioria dos brasileiros e continua firme neste mister –, que teve o mérito de nomear Fernando Henrique Cardoso ministro da Fazenda, responsável pela salvação econômica e social do Brasil a partir do Plano Real. O outro foi o próprio FHC que estabeleceu as bases para o desenvolvimento sustentável da Nação. Diga-se de passagem, um avanço que seria eliminado pelos seus sucessores. 

Ao descrever a atuação de FHC, Jabor deixou de citar dois pontos que considero fundamentais. Foi na gestão dele que surgiu o instrumento essencial ao suporte das ações para estabilização econômica: a Lei de Responsabilidade Fiscal, que colocou os governos – nas três esferas de Poder – sob austera vigilância para o cumprimento do equilíbrio orçamentário, fiscal e financeiro. Também merece destaque o desempenho da sua esposa, a socióloga Ruth Cardoso, na implantação de programas de verdadeira promoção social, sem paternalismo barato. 

Nas palavras de Jabor, a eleição de Lula, em 2002, foi o pior desastre político do século. Bateu o recorde histórico da corrupção, com a ajuda de José Dirceu, Antonio Palocci, Marcos Valério, Delúbio Soares e outros da sua volumosa corriola. Já Roberto Jefferson, apesar de corrupto, teve a decência de delatar os mensaleiros – pena que livrou o chefão! 

Na visão de Jabor – com a qual corroboro –, Lula se aproveitou da baixa condição socioeducativa e cultural do povo brasileiro. Enganou a população com demagogia e gastou o dinheiro que o País não tinha em ações clientelistas. Forjou-se como ídolo e vendeu ao mundo inteiro a autoimagem de salvador dos pobres. Ao mesmo tempo, alardeou ter alcançado a melhor gestão pública da história com o crescimento do PIB de 5% a 7%. Longe dos holofotes, inchou a máquina administrativa e levou os cofres públicos à míngua. 

Mestre na arte de criar e vender ilusões, Lula ludibriou a população brasileira, governantes estrangeiros e líderes mundiais. Fez mais. Elegeu centenas de postes como prefeitos – inclusive Fernando Haddad, da maior cidade da América Latina –, muitos governadores, como Jaques Wagner, ex da Bahia, e até a presidente Dilma Rousseff. Esta última reeleita e na mira da cassação por malfeitos. 

A avassaladora multicrises nacional será um instrumento de modernização. A expectativa é a de que sirva para sepultar o modelo ultrapassado de demagogia e corrupção que engole todos os setores da sociedade. Assim como Jabor, estou otimista. Também não vejo o interino Michel Temer como solução. Entretanto, é a faísca de esperança para começar a reversão do quadro atual. 
"Os cidadãos de bem dispensam a idolatria vã."

Contudo, o único motor capaz de mover as engrenagens da retomada do crescimento econômico-social é o povo brasileiro. Mais do que nunca, a população precisa ser responsável, assumindo seu papel de recuperar o que lhe pertence: a Nação. Paralelamente, tem de ficar imune ao canto das sereias espertalhonas que, por interesse próprio, travestem-se de pseudossalvadores para permanecerem no poder e viverem às custas dos brasileiros. O Brasil não carece de autoproclamados heróis. O arsenal histórico já está repleto de gente assim, mais tarde identificada como vilã. Os cidadãos de bem dispensam a idolatria vã. Têm de fiscalizar, protestar, lutar contra a corrupção e os desmandos. Vamos todos nos empoderar e resgatar o País. O momento é agora! Valeu a palestra, Jabor!

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

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