#RevisãoDeRumos – Semanas atrás, veio o
anúncio da indústria automotiva Ford de que, após 100 anos, fechará suas
fábricas no Brasil. Na opinião de especialistas da área, o fenômeno vem
acontecendo gradativamente desde o Plano Real, deteriorando-se com o governo
Dilma Rousseff e recrudescendo na pandemia. As razões são inúmeras.
Como modesto observador do
desenvolvimento nacional, recuo no tempo para concluir que o processo de perdas
começou no período do governo Juscelino Kubitschek, ao priorizar a indústria automobilística
para o crescimento brasileiro. Cometeu-se um erro crasso e uma estratégia
mortal, ao deflagrar o célere sucateamento do sistema ferroviário,
notadamente num País com dimensão continental. Os governantes ficaram
anestesiados pela revolução automotiva, verdadeiro canto do cisne. O bom senso
indicava o desenvolvimento da indústria automobilística. Contudo, sem parar o
investimento no modal ferroviário para o deslocamento de cargas e o transporte
de passageiros em trens e metrôs.
Claro, a cadeia produtiva da indústria
automotiva, além de colossal, gera empregos, tributos e riquezas imediatas.
Ainda hoje, com crescente automação, modernização e tecnologia, ela é a campeã
na geração de empregos. Os olhos dos políticos só enxergaram isso. Foi lamentável
e mortal! Afinal, o sistema ferroviário é imbatível no deslocamento de pessoas
e de cargas. Repito, principalmente num País continental. Faltaram governantes
com espírito estadista. O interesse político-eleitoral prevaleceu e, até agora,
nada mudou.
Quando se fala no alto custo Brasil,
dentre dezenas de fatores negativos, despontam o Real altamente desvalorizado frente
ao dólar; a voraz, perniciosa e escandalosa tributação, uma das mais altas do
mundo; o alto custo social da relação trabalhista; empreendedores e
trabalhadores sem a devida formação profissional; burocracia sistêmica;
estrutura logística e produtiva arcaicas, que ocasionam queda nos índices de
produção e, por último, o esfacelamento do modelo ideal – o binômio ferrovia-rodovia.
Além de entusiasta, sou pragmático em
referência ao sistema ferroviário. Pagamos a conta de estratégias
governamentais equivocadas que permanecem há décadas. Para produzir cereais (commodities) no centro-oeste, norte e
parte do nordeste – por mais que o Brasil seja privilegiado no agronegócio –,
por ausência de ferrovias, o custo eleva-se no mínimo 20%, em comparação com
países como EUA, Canadá, China e Rússia dentre outros, diminuindo o poder
competitivo. No tempo das safras, há veículos encalhados em rodovias de terra,
custo descomunal de pedágios e cidades portuárias com congestionamentos monstruosos.
Nas cidades brasileiras, o mal é maior. Sem
trens e metrôs suficientes e com o transporte público automotivo precário,
milhões de veículos vivem diariamente congestionando vias públicas,
gerando caos e prejuízos incalculáveis.
Caso não haja mudanças corajosas na conduta
dos gestores públicos, com visão estadista, para proporcionar novas
alternativas de modelo econômico mais equilibrado, não será somente a Ford.
Inúmeras outras multinacionais deixarão o Brasil e as empresas nacionais
continuarão fechando suas portas. O quadro impulsionará ainda mais o desemprego
que já vitima 14,1 milhões de trabalhadores.
Só interesseiros, insensíveis e
despreparados não se importam com desgraças desta dimensão catastrófica. Estamos
cada vez mais submissos a países que trabalham intensamente, com sentimento
global, exportando desde produtos de R$ 1,99 até de alta tecnologia abrangendo
todos os setores, insumos diversos e sem exclusão dos automotivos. Tornamo-nos um
País importador, seja industrial ou comercialmente falando.
Já nos tornamos, há algum tempo,
escravos de outras nações que ceifam nossos empregos, debilitam nossas empresas
e matam nossa economia. Logo, logo, estaremos amargando a condição de País
dormitório.
Que as observações e comentários
modestos deste cidadão octogenário ajudem a inspirar mudanças no Brasil. E que possamos
cantar, com peito estufado de glória, o Hino Nacional, especialmente no verso:
“Gigante pela própria natureza. És belo, és forte, impávido colosso. E o teu
futuro espelha essa grandeza”.
Junji Abe, produtor e líder rural, é ex-prefeito de Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo
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