quinta-feira, 12 de maio de 2016

Divino significado

“Os devotos do Divino vão abrir sua morada
Pra bandeira do menino ser bem-vinda, ser louvada.
Deus nos salve esse devoto pela esmola em vosso nome
Dando água a quem tem sede, dando pão a quem tem fome...”
Ivan Lins

Debaixo da neblina que ainda abraça o horizonte, uma multidão produz a alquimia de aquecer o frio com o poder da oração e, sob o céu de nuances vermelho e laranja, veste as ruas com as cores de suas bandeiras. São os devotos do Divino Espírito Santo em mais uma procissão da Alvorada. Com suas preces e cânticos, orquestram a festa de devoção que purifica a alma. É preciso estar lá, entre eles, para sentir o rastro de luz que se forma por onde passam. Participar do cortejo é como abraçar o Criador. E ser envolvido por uma indescritível sensação de paz, que parece abrir a mente para entender e absorver o profundo significado dos sete dons do Espírito Santo. 

É verdadeiro, intenso e exato. Vale conhecer! O dom da Sabedoria nos mantém voltados para o bem. Com entendimento, aprendemos a buscar a verdade. A dádiva do Bom Conselho nos ajudar a escolher o melhor caminho. Já a Fortaleza é a coragem, a força para enfrentar as adversidades. Para compreender os sinais dos tempos, há o dom da Ciência. Com a Piedade, nutrimos a compaixão pelo próximo e a caridade. O sétimo dom é o Respeito a Deus, aos valores do amor e da bondade, que nos faz fugir de toda a maldade. 

A Festa do Divino Espírito Santo de Mogi das Cruzes mexe com a Cidade e atrai milhares de visitantes de outros municípios, estados e até do exterior. São 11 dias de uma extensa programação. Alvoradas, novenas, missas, procissão que percorre as ruas bordadas com flores e cereais, todos os eventos são essenciais para nós, cristão católicos. 

Neste ano, os festejos prosseguem até domingo, dia 15. Na véspera, tem a Entrada dos Palmitos. Trata-se de um cortejo fabuloso, com milhares de devotos, cada qual carregando a Bandeira do Divino e cantando, com fervor. Há também os grupos de congada e marujada, tocando e dançando, cavaleiros, carros de boi enfeitados e com o rangido característico das rodas – em gratidão à colheita – e muitas crianças, umas concentradas, outras infinitamente alegres. Tudo, numa autêntica manifestação de fé e louvor ao Divino Espírito Santo. 

Sempre levei em consideração os ensinamentos dos missionários, fossem bispos ou padres, de que o aspecto festivo do Divino deve ser precedido, fortemente, pela parte religiosa, com o objetivo de plena evangelização. Em 2001, primeiro ano de nosso mandato como prefeito, pedi à Comissão Pró-Festa do Divino que analisasse a possibilidade de instalar o subimpério na Prefeitura. Resposta positiva. De lá para cá, todo ano, o ritual se repete. 

Ainda em 2001, o Criador me proporcionou outra inédita e generosa participação na Festa do Divino Espírito Santo. Em companhia de dezenas de funcionários municipais, servimos a milhares de devotos o afogado – prato tradicional do evento, à base de carne e legumes. Foi uma noite memorável – a primeira de muitas que viriam nos anos seguintes. Tornou-se uma espécie de tradição o prefeito e alguns colaboradores dedicarem uma noite à tarefa de servir o afogado. 

A parte festiva do evento, inclusive o afogado, ocupava tímida área ao lado do Ginásio Municipal de Esportes. Não comportava os visitantes e não havia vagas para estacionamento, impedindo o crescimento da Festa. Em 2002, resgatamos um imenso espaço que servia como “cemitério de carros” apreendidos por documentação irregular. Com infraestrutura adequada, o local tornou-se um polo de eventos ao lado do Centro Municipal Integrado (CMI) Deputado Maurício Nagib Najar, no Mogilar.

Já em 2002, oferecemos à Associação Pró-Divino o novo espaço para realização de toda parte festiva, incluindo as dependências do prédio para garantir aos visitantes espaço apropriado para saborear o afogado. No segundo mandato à frente da Prefeitura, instalamos sanitários e completamos com a Avenida Cívica. Assim, acabava o martírio da falta de vagas para estacionamento. 

Foi o nosso jeito de dar o mínimo de retribuição aos devotos, sob a forma de conforto e segurança, demonstrando nossa gratidão e colaborando para o desenvolvimento da Festa. Sabíamos que o público aumentaria ano após ano em ritmo acelerado, como vem acontecendo. 

Ostento a Bandeira do Divino com todo orgulho que ela inspira e toda humildade que ela representa. Mas, confesso que deixo a desejar como verdadeiro praticante da minha religião católica. Contudo, sustento fé inquebrantável em Deus. Tenho recebido tudo o que poderia esperar da vida – família unida, saúde, amigos, paz de espírito, muito amor para dar, enfim, sou alguém feliz e super agradecido.
"Ostento a Bandeira do Divino com todo orgulho que ela inspira e toda humildade que ela representa."
Cresci com o budismo – religião dos meus avós, imigrantes japoneses – cujos ensinamentos, em grande parte, moldaram minha alma. Depois, aderi ao catolicismo e, no cotidiano, aprendo muito com evangélicos, espíritas e seguidores de outros credos sobre o imprescindível valor da religião em nossa vida. E, assim, ganho mais força para lutar sempre pelo respeito à diversidade em todos os sentidos e pela valorização das divinas diferenças entre os seres humanos. Afinal, estas são as regras sabiamente criadas pelo Senhor. 

A Festa do Divino Espírito Santo de Mogi das Cruzes une religiosidade, cultura e tradição de mais de 300 anos. Mas, não é só. Renova a fé, inspira a solidariedade e resgata valores éticos adormecidos. A perfeita conexão entre a beleza da forma e a nobreza do conteúdo está em tudo. No Império do Divino, nas procissões, no entusiasmo das voluntárias no café matinal, na nobre missão das rezadeiras, na Entrada dos Palmitos, em cada bandeira ostentada com orgulho. Está também no afogado, nos doces das “abelhinhas” e em tantos outros quitutes da quermesse – fruto da dedicação de fiéis que se transforma em benefícios para pessoas carentes. Diante de tantas dádivas, basta ter fé, participar e rogar ao Divino que derrame seus dons sobre a nossa Cidade, nosso Estado, nosso Brasil e nossa gente. Na atualidade de recessão econômica e instabilidade política, mais do que nunca! Amém!

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

Nenhum comentário:

Postar um comentário