quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Lama da morte

É de chorar. Não há consolo para a hecatombe que já matou 13 pessoas, deixou 11 desaparecidas quase um mês depois, desabrigou centenas de outras, dizimou milhares de espécies animais e vegetais, condenou recursos naturais e comprometeu a biodiversidade de tal forma que não há previsão de recuperação nem para as gerações futuras. Pior. Os estragos ainda não foram contidos. Multiplicam-se com celeridade ampliando o rastro de destruição para a natureza e para a população. No meio urbano, o caos do desabastecimento – de água, de alimentos, de tudo –; na zona rural, o fim da subsistência de produtores que estão perdendo suas plantações e seu gado porque já não há água e nem pasto. 

O rompimento da barragem em Mariana (MG), catalogado como o maior desastre da indústria de mineração no País, desencadeou o tsunami de lama que matou o Rio Doce. E, junto, a fonte de vida de pessoas, animais e vegetais, ligados direta ou indiretamente a ele. Espalhou-se um volume estimado de 40 bilhões de litros de lama, o equivalente a 16 mil piscinas olímpicas (cada uma comporta 2,5 milhões de litros). O material está contaminado por alumínio, ferro, cobre, manganês, cádmio, chumbo e mercúrio. Devastou cidades mineiras, já atingiu o litoral do Espírito Santo e pode chegar à Bahia. 

"Assistimos, atônitos e agoniados, à jornada da lama da morte"
Assistimos, atônitos e agoniados, à jornada da lama da morte, sem ver os responsáveis pela tragédia – Samarco, mineradora da Vale e da empresa anglo-australiana BHP Biliton – adotando medidas para reverter a contaminação. E também para evitar novas ocorrências, considerando que outras duas barragens (Santarém e Germano) ainda têm risco de estourar. Igualmente, não há sinal de punições à altura da gravidade da tragédia. A multinha aplicada é risível. Cadeia? Nem pensar. Em outras nações, acidentes de menor proporção teriam desencadeado ordem imediata de ações saneadoras e prisões em série.

Aqui no Brasil, tudo que se sabe é que não se sabe o que causou a ruptura da barragem do Fundão. Embora caríssimos, existem tratamentos para minimizar os impactos da contaminação. Porém, não serão levados adiante por conta da pasmaceira do poder público frente à tragédia anunciada de Mariana. Sim, porque fiscalização e denúncias apontavam os riscos de rompimento do reservatório de rejeitos da exploração de minério de ferro. Porém, nada foi feito. Ficou tudo nas rédeas do destino. Aliás, assim tem sido, sucessivamente, ao longo da história nacional. Apesar das desgraças, perduram a imprevidência e a impunidade. 

Ou alguém duvida do quão conveniente é escolher o Brasil para lidar com atividades desse gênero – rejeitos (=lixo) da exploração de minério de ferro –, que apresentam altos riscos à saúde e ao meio ambiente? Primeiro, a fiscalização varia de nula à deficiente. Segundo, se algo dá errado, o prejuízo financeiro da empresa é ínfimo, comparado ao custo socioambiental dos danos. E fica nisso. 

Não por menos, há situações emblemáticas na Região do Alto Tietê, como a explosão do lixo depositado no aterro sanitário da Pajoan, em Itaquaquecetuba, quatro anos atrás, ou o rompimento, em 2010, do duto de combustíveis da Transpetro, na Volta Fria, em Mogi das Cruzes. Em ambos os casos, o passivo ambiental persiste, sem que a aplicação de multas tenha forçado sua eliminação. 

O que se faz é tentar apagar incêndio ou botar tranca depois da porta arrombada. Por exemplo, no caso mogiano, enquanto deputado federal, cobramos, seguidas vezes, providências da Transpetro para resgatar o bem-estar das famílias e acelerar a remediação dos danos ambientais. Nada funcionou. Até apresentamos projeto de Lei (5508/2013) para forçar a prevenção de rompimento de dutos de combustíveis. Quando deixei a Câmara, em janeiro último, a proposta foi arquivada. 

Enquanto o poder público no Brasil continuar cúmplice da política do descaso com a sociedade, praticada por empresas que mantêm atividades geradoras de risco socioambiental, estamos fadados a conviver com ameaças de reprises de tragédias. Até que o destino resolva consolidá-las. Se nada mudar, não tardará para que outras hordas de lama da morte cubram o território nacional, aumentando a conta do descalabro para as gerações futuras. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Natal da recessão

O brasileiro pretende gastar quase 15% menos do que no ano passado em suas compras de Natal. O gasto médio por presente deve ser de R$ 106,94 contra os R$ 125,22 desembolsados em 2014. A quantia cai para R$ 97,85, se considerados os compradores das classes C, D e E. Os números foram calculados com base em 93% dos entrevistados que mostraram intenção de presentear alguém. Em média, cada consumidor planeja contemplar não mais que cinco pessoas.

Esses dados constam da pesquisa SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito) e da CNDL (Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas), realizada em todas as capitais com 601 entrevistas. O movimento natalino de 2014, que já havia registrado vendas cerca de 1% abaixo das do ano anterior, será ainda mais modesto em 2015.

Até aqui, sem novidade. Afinal, a economia nacional cambaleia com índices crescentes de inflação e desemprego, associados a quedas históricas dos níveis de atividade econômica. Para ilustrar, basta dizer que o volume de serviços prestados no País desabou 4,8% em setembro em relação ao mesmo mês do ano passado, segundo pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 

As projeções nada animadoras vêm junto com o temor justificado do sumiço da fonte de renda. Trabalhadores vivem a tensão cotidiana de perder o emprego. Pequenos empresários, às voltas com a queda do movimento, enfrentam a ameaça de encerramento das atividades. Nem só os microempresários nadam contra a maré. Há grandes lojas que nem contratarão temporários para o fim de ano, ao contrário de temporadas anteriores.

O Natal de vacas magras chega com alerta máximo para que se evite dívidas. Sem dinheiro na mão, não compre. Se tem, pague à vista. É a intenção de 42,3% dos ouvidos na pesquisa do SPC. Parcelar em cinco vezes no cartão de crédito foi a alternativa apontada por 27,7%. Mesmo sem juros, está longe de ser boa opção. Afinal, o consumidor estará pagando a compra até maio, ao lado do bolo de gastos do início do ano – IPTU, IPVA, material escolar etc. Pior, apostando num otimismo que a recessão oficial não inspira.

É tempo de prudência. Quem tem criança em casa, sabe o quanto faz falta um presente para dar no Natal. Isso me faz lembrar da minha infância. Não existia a magia dos brinquedos sofisticados, videogames e tablets. Ainda que houvesse, meus pais – imigrantes japoneses, agricultores – não poderiam comprar. 

Meninos ganhavam carrinhos de madeira de caixote de verduras e as meninas recebiam bonecas de pano. Tudo feito em casa mesmo. E sem papel de presente. O mais aguardado, contudo, era o que tinha na mesa. Uma vez por ano, no Natal, a gente bebia refrigerante (sem gelo, porque não tinha geladeira). Como era bom! Até hoje, recordo-me da alegria que era ouvir o barulhinho da garrafa sendo aberta. 

As dificuldades são grandes mestras. Crescer longe de farturas e do acesso desmedido às coisas que só dinheiro compra pode tornar alguém melhor preparado para enfrentar adversidades, muito mais solidário e totalmente avesso a desperdícios. Ser privado de presentes caros não traumatiza ninguém. Na verdade, ajuda a ensinar o valor das pequenas dádivas. Grande mesmo tem de ser o amor em família. 
"Neste Natal da recessão, não faça dívidas.
Faça as boas lembranças de amanhã." 

As crianças podem ser bem mais compreensivas e generosas do que se pensa. Quase tudo que, de fato, interessa na vida, não vem em pacotes coloridos, com laços e pompas. Surge da simplicidade. Vem do coração. Neste Natal da recessão, não faça dívidas. Faça as boas lembranças de amanhã. #ficaadica 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Efeito bumerangue

O Brasil é o quinto país mais violento para as mulheres num ranking de 83 avaliados pela Organização Mundial de Saúde. A taxa de homicídios contra a população feminina cresceu 8,8% entre 2003 e 2013. Significa que, no período, 11 foram assassinadas por dia. Pior é que mais da metade delas (50,3%) foi morta por um familiar. Em 33,2% dos casos, o feminicídio foi praticado pelo próprio parceiro ou ex-parceiro. 

Os dados constam do “Mapa da Violência 2015 – Homicídios de Mulheres no Brasil”, coordenado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz e divulgado pela Flacso/RJ (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais). A situação catastrófica não é peculiaridade de regiões distantes das capitais. Aqui no Alto Tietê, seis dos dez municípios estão entre os mil com mais casos registrados no País. Em nossa Mogi das Cruzes, foram 30 assassinatos femininos entre 2009 e 2013.

É bem verdade que o aumento da taxa de homicídios contra mulheres reflete o avanço generalizado da violência em todo o País. Isto não muda a urgência de aperfeiçoar medidas capazes de inibir os assassinatos femininos. Um dos pontos cruciais é conscientizar a mulher para que denuncie a agressão sofrida. Hoje, o crime foi bater; amanhã, pode ser matar. 

É dever do poder público garantir o acesso à rede de proteção feminina. O assunto sempre esteve entre minhas prioridades na vida pública. Enquanto deputado estadual, por exemplo, participei ativamente das ações para viabilizar a instalação da Delegacia de Polícia de Defesa da Mulher em Mogi das Cruzes, efetivada em 8 de julho de 1991. Como prefeito, acolhi as solicitações das autoridades de segurança pública do Estado para, com recursos do orçamento municipal, concretizar o novo prédio da unidade, inaugurado em 18 de abril de 2006 no Parque Monte Líbano, onde está até hoje. 

Ao mesmo tempo, é imprescindível combater a impunidade. Há legislação boa, com foco na proteção das mulheres, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio (assassinato de mulheres derivado de violência doméstica), sancionada em março último. Contudo, a velocidade do Judiciário não ajuda no processo de intimidar os criminosos. A demora só intensifica o entendimento de que o malfeitor acaba impune.

O coordenador do estudo apontou o machismo como o principal responsável pela maioria dos assassinatos cometidos contra as mulheres no Brasil, que tem uma sociedade extremamente patriarcal. Até pouco tempo atrás, havia justificativa legal para o homem matar uma mulher que o traísse. Concordo que é necessário vencer barreiras culturais para possibilitar a evolução equilibrada da sociedade. Mas, não compactuo com o conceito de que todo homem é um ser desprezível que, na primeira oportunidade, oprimirá a mulher. 

Tenho visto nas redes sociais uma onda crescente de propagação de ódio às diferenças de gênero. Começou com as pregações contra homossexuais, avançou contra a população trans e, há algum tempo, contra os homens. É preciso cautela para evitar a generalização indevida das pessoas. Antes de tudo, somos seres humanos, dotados de virtudes e defeitos. 

Sou um admirador declarado das mulheres e suas habilidades incríveis, como o sexto sentido – invariavelmente, certo, ainda que não saibamos bem por que –, a extrema sensibilidade e a capacidade multifuncional – fazem diversas coisas ao mesmo tempo, sem se perderem. Defendo que tenham os mesmos direitos, oportunidades e salários que os homens. Isto não faz de mim um feminista. Até porque, creio que o público masculino também tem seus méritos. 

"Sua intolerância de hoje pode ser a mesma
 de alguém contra vocês amanhã."
Podem me chamar de retrógrado ou até me acusar de machista. Mas, ainda acho que determinadas atitudes são deveres do homem. Por exemplo, abrir a porta do carro para uma dama entrar ou sair, carregar o saco de lixo pesado para fora, colocar as compras pesadas para dentro, consertar o chuveiro que pifou, abrir pote com tampa emperrada, matar o rato que entrou no motor da máquina de lavar, desentupir a tubulação de esgoto e outras. Não que a mulher esteja impedida de desempenhar essas tarefas. Mas, em princípio, elas são obrigações de homem. Pronto, comecem a arremessar os dardos! Mas, lembrem-se do efeito bumerangue: sua intolerância de hoje pode ser a mesma de alguém contra vocês amanhã.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Bendita concorrência

As duas maiores operadoras em número de clientes de celulares pré-pagos anteciparam o fim do chamado “efeito clube”. Tim e Oi deixaram de cobrar mais caro dos clientes nas chamadas para empresas concorrentes. Contudo, o acesso ao benefício está vinculado à migração para novos planos. Já é alguma coisa, considerando o péssimo – e caríssimo – serviço de telefonia vigente no País.

Desde a popularização da telefonia celular, as teles fazem os usuários pagarem valor maior por minuto nas ligações completadas para empresas concorrentes. A ideia sempre foi incentivar o cliente a chamar números da própria operadora, independentemente do local onde cada um esteja no País. Todas dão descontos nestas chamadas. Criaram, assim, o tal “efeito clube”. Tanto, que conheço gente que anda com quatro chips para trocá-los dependendo da operadora do destinatário. 

Essa prática acabou incorporada à rotina de quem usa celular pré-pago. Na modalidade pós-paga, sempre que um cliente liga para um número concorrente, também desembolsa mais por minuto para bancar os custos pela interconexão entre as redes das empresas. A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) determinou a redução gradativa dos valores de interconexão entre as operadoras. Hoje, é de R$ 0,16 por minuto. Em fevereiro do ano que vem, passará a R$ 0,10, e desaparecerá em 2018. Ou seja, o “efeito clube” está com morte anunciada.

A revisão do valor, anunciado pela Anatel, chega com mais de 14 anos de atraso em relação ao que consta na Lei Geral de Telecomunicações. Os brasileiros arcam com as mais altas tarifas de interconexão do planeta. A distorção garante até 40% da receita das operadoras, prática ilegal, severamente punida em outros países e banida nas matrizes das respectivas empresas que aqui atuam. Esse foi um dos motivos que me levaram a insistir na constituição da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Telefonia Móvel na Câmara dos Deputados. Infelizmente, isto não aconteceu até o fim do meu mandato, em janeiro último. 
"O 'efeito clube' está com morte anunciada."
A CPI investigaria as quatro maiores operadoras de telefonia móvel – Vivo, Oi, TIM e Claro – a fim de analisar alegações para elevadas tarifas, cobranças inadequadas, mau atendimento aos usuários que, sequer, recebem explicações, e falhas sistemáticas nas ligações, como quedas e falta de sinal. Também apuraria o que foi arrecadado desde 1997 e se houve investimentos compatíveis. Os péssimos serviços mostram que a conta não fecha.

Duas das quatro grandes operadoras só anteciparam o fim do ônus de interconexão. Não pensem que a medida surgiu da benevolência dos respectivos comandos empresariais. É o reflexo claro da concorrência com aplicativos que possibilitam chamadas de voz pela internet, como o WhatsApp. Por que o usuário pagará por uma ligação que pode fazer de graça, desde que tenha conexão com a rede mundial de computadores? Em especial, num momento em que virou ordem geral a disponibilização livre de redes Wi-Fi em comércios e locais públicos. 

Empresas como a Vivo se manifestam com furor contra o serviço do WhatsApp e aplicativos similares. Evidente que tiram receita das operadoras. Verdade é que as teles já ganharam e continuam abocanhando muito dinheiro dos usuários brasileiros. Ocupando a desonrosa liderança no ranking de reclamações, as operadoras de telefonia móvel agem como querem, sem que a Anatel tome providências. Para prestar um serviço menos eficiente que sinal de fumaça, cobram preço de ouro dos usuários. As tarifas são mais predatórias para quem tem plano pré-pago: os donos de 208 milhões das mais de 280 milhões de linhas de celulares em operação.

Ainda tramita na Câmara um projeto de Lei (4524/2012), de minha autoria, que proíbe valores diferenciados entre as duas modalidades de serviço – pré e pós-pagas. O objetivo é acabar com a lambança de cobrar mais de quem paga antes para usar o celular. Cerca de 74% da população, incluindo os menos favorecidos, brindam operadoras com pagamento antecipado e, mesmo assim, arcam com tarifa, no mínimo, 130% acima da cobrada do cliente de pós-pago. Enquanto faltam regras apropriadas, fiscalização e punições às teles, resta-nos a salutar concorrência. Bendita concorrência! 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Veterinária popular

Em meio a tantas más notícias no Brasil, pinço uma positiva para baratear o tratamento de animais no campo e nas cidades. A Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara Federal aprovou o projeto de lei (4148/2012) que apresentei em conjunto com o deputado César Halum (PRB-TO). Trata-se da proposta que cria as farmácias veterinárias populares, aos moldes da rede já existente para comercialização de medicamentos humanos a preços subsidiados.

Para que a iniciativa vire lei, serão necessários os pareceres favoráveis das comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, assim como o aval do Plenário da Casa. De qualquer forma, o avanço da proposta já é algo bom, considerando que não estou no exercício do cargo de deputado federal.

Nosso projeto prevê que as farmácias veterinárias populares formalizem convênio com a União, Estados, Distrito Federal e Municípios para vender ao consumidor medicação veterinária a preços subsidiados. A iniciativa complementa e fortalece a legislação (lei 12.689/2012), que estabelece o medicamento genérico de uso veterinário no Brasil, para beneficiar tanto os míni e pequenos criadores quanto as pessoas que têm animais de estimação em casa, além de contribuir para resguardar a saúde pública. 

As farmácias veterinárias populares facilitarão o tratamento dos animais, por meio do acesso aos remédios com preços subsidiados. A introdução dos genéricos veterinários já tende a baratear a medicação em cerca de 30%. 

No campo, estão mais de 4,3 milhões de produtores de pequeno porte que atuam em 84% das propriedades rurais brasileiras e respondem por cerca de 10% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional. A maior parte cria animais como peixes, aves, suínos e gado leiteiro, entre outros, para consumo e venda em pequena escala.

A medicação veterinária é fundamental para criadores de todos os tamanhos. Mas, nas pequenas propriedades, a preocupação é maior, porque o baixo resultado financeiro da atividade agrícola mal garante o sustento das famílias. E não sobra dinheiro para cuidar da saúde dos animais criados por esses pequenos produtores. A situação ameaça o desempenho da economia brasileira: os principais focos de doenças animais podem surgir em pequenos imóveis rurais e, depois, se alastrarem para outras áreas. 

No meio urbano, a legislação proposta também trará benefícios diretos ao controle de zoonoses. Como exemplo, está a leishmaniose visceral ou calazar, uma enfermidade transmitida pelo mosquito-palha. Ao picar, o inseto introduz na circulação do hospedeiro o protozoário responsável pela infecção que pode passar do animal para o ser humano.
"A introdução dos genéricos veterinários já tende
 a baratear a medicação em cerca de 30%."
Com medicamentos veterinários vendidos a preços mais acessíveis, as famílias com animais de estimação terão maiores condições de providenciar o tratamento de seus cães, gatos e pássaros, entre outros. Quem já passou pelo sofrimento de ter seu bichinho doente e não dispor de recursos para bancar os remédios sabe bem o que isso significa. 




Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Combinação mortal

Uma mulher com sinais de embriaguez atropelou e matou dois em São Paulo. Uma das vítimas era gari. O outro pintava uma ciclovia na rua. Para completar, a motorista ainda tentou fugir. Os casos se multiplicam com voracidade. Dificilmente, uma semana termina sem ocorrências no trânsito, causadas por gente que insiste em dirigir alcoolizada. Já as punições tropeçam mais do que bêbado e, não raro, passam longe do esperado rigor sendo transformadas em prestação de serviços à comunidade. A sensação de impunidade vira combustível para novos registros de condutas lesivas.

Com a prática ilegal de dirigir alcoolizado ou drogado, os malucos do volante tiram milhares de vidas, inclusive as próprias, ou mutilam suas vítimas no País inteiro. Acidente? Ora, se o motorista resolve dirigir sob influência de álcool ou drogas, sabe que corre o risco de matar e ferir. Se acontece, ainda que sem intenção, não foi acidente. Não adianta dizer que tomou só um copinho de cerveja ou uma taça de vinho. Álcool no organismo afeta as condições normais do indivíduo. Seus efeitos variam para cada pessoa. Mas, a regra vale para todos: se beber, não dirija. Ponto final. 

Por mais que parte dos motoristas reclame das regras de trânsito, elas existem para serem cumpridas. Apesar da fiscalização, um sem-número de infratores sai impune dos abusos que comete. Nas saídas de bares e restaurantes, muitos frequentadores saem trançando as pernas e assumem o volante. Podem chegar em casa sem ter causado tragédia. Mas, nada fizeram para evitá-la. Se são flagrados por um radar em razão do excesso de velocidade, são os primeiros a acusarem o poder público de cultivar uma indústria de multas.

Abro parênteses para uma observação. Parte da população e da mídia, que combate as irregularidades, alimenta total aversão aos radares eletrônicos. Muitos se esquecem de dois fatores. De um lado, está a Lei de Responsabilidade Fiscal que, de 20 anos para cá, limita os custos com folha de pagamentos, restringido contratações. De outro, o aumento da criminalidade diminui o contingente de policiais para fiscalização do trânsito. Se o poder público não puder contar com a tecnologia dos radares para coibir irregularidades, haverá cada vez mais abusos e mortes. 

"Será que quem comete uma irregularidade não deve
ser punido e a culpa é de quem fiscalizou?"
Será que quem comete uma irregularidade não deve ser punido e a culpa é de quem fiscalizou? Recentemente, o Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) organizou blitze em Mogi das Cruzes para flagrar motoristas embriagados. Dos 157 que fizeram o teste do bafômetro, oito foram autuados por embriaguez ao volante e multados no valor de R$ 1.915,40, cada um, além de responder a processo administrativo junto ao órgão pela suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Metade deles também enfrenta a Justiça por crime de trânsito, devido à dosagem maior de álcool ingerido. Choveram reclamações nas redes sociais.

Penso que a fiscalização tem de ser ainda maior. Não é com hipocrisia que se combaterá a incidência de práticas criminosas como a de dirigir alcoolizado. Já passou da hora de parar de olhar só o próprio umbigo. Como parte da sociedade, cada um tem a obrigação de respeitar as regras. Pode haver blitze o tempo todo. Se um motorista anda na linha, não tem o que temer. Caso contrário, viveremos em eterna contradição. Será algo como a pichação que vi, feita contra a fachada de uma casa, com os dizeres: “Cumpra seus deveres!”. Ou seja, você deve cumprir; quem pichou está isento.

Para tentar reduzir a sanha dos condutores embriagados, a alternativa encontrada tem sido endurecer as punições do Código de Trânsito Brasileiro. Está em análise no Senado projeto aprovado pela Câmara dos Deputados que dobra a pena para o motorista alcoolizado responsável por acidente com morte. Passará a ser de 4 a 8 anos de reclusão. Quem pegar a pena máxima terá de cumprir a punição na cadeia, em regime fechado, porque acaba a possibilidade de conversão para prestação de serviços à comunidade.

Num País onde a educação não é levada a sério como deveria e boa parte dos pais se exime da responsabilidade de incutir valores morais e éticos nos filhos, resta o endurecimento das penalidades para tentar frear a incidência da combinação mortal de álcool e direção. E, com ela, as ações desastrosas dos malucos do volante. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Missão de ensinar e aprender

"Eleger a educação como prioridade é decisão
de governo. E isto deve ser feito nas três esferas"
A realidade mostra que o educador está longe de motivos para comemorar o Dia do Professor. Em nosso Estado, o setor está às voltas com a propalada reorganização escolar que, em tese, seria uma proposta promissora. Porém, arremessada de forma atabalhoada e sem prévia discussão com a comunidade, desencadeou rumores de fechamento de escolas e dispensas. Nada teve confirmação oficial, mas serve para aterrorizar mais um segmento extremamente fragilizado por sucessivas manifestações de descaso governamental.

A valorização do professor passa, obrigatoriamente, pelo aumento de salário. Mesmo que a correção venha de forma escalonada, tem de começar já. O governo tem falhado no reconhecimento e aprimoramento do profissional, assim como na oferta de condições para que o educador desenvolva suas funções. Parte da sociedade repete o malfeito, deixando de dar aos filhos educação no lar. E joga a responsabilidade nas costas do educador.

Eleger a educação como prioridade é decisão de governo. E isto deve ser feito nas três esferas – federal, estadual e municipal. Se cada um cumprir a sua parte, a médio prazo, os frutos virão. A prova está em Mogi das Cruzes, Cidade que comandei por oito anos seguidos. Chegamos em 2001, com um cenário de caos na educação, marcado por famílias que acampavam em frente às escolas para conseguir vagas. 

Era imprescindível garantir o acesso do aluno à unidade escolar, motivar seu desenvolvimento em um ambiente seguro, atendido por profissionais valorizados e professores qualificados para uma ação pedagógica cada vez mais eficiente numa rede escolar integrada com a comunidade, dotada de estrutura física e operacional apropriadas, em sintonia com os avanços tecnológicos.

Seria muita pretensão dizer que Mogi das Cruzes está à frente das demais cidades do País. Nas últimas décadas, contudo, os gestores municipais se dedicaram ao setor. Enquanto fui prefeito, por exemplo, tratamos de respeitar o magistério, com remuneração valorizada – e, comparativamente, bem melhor que de outros municípios – e plano de carreira para os profissionais da Educação. 

Também investimos pesado na capacitação, aperfeiçoamento e reciclagem dos docentes. Uma das realizações emblemáticas foi o Cemforpe (Centro Municipal de Formação Pedagógica) que possibilitou programas contínuos de qualificação para os professores. Não bastasse, redimensionamos o formato de escola convencional, com a construção de prédios modernos e amplos, todos com quadras poliesportivas, dotados de bibliotecas multimídias e laboratórios de informática, abertos à comunidade nos finais de semana. 

Visando a inclusão de alunos portadores de necessidades educacionais especiais, criamos o inédito Pró-Escolar. Representou um circuito específico para atender este público que, antes, exigia esforços sobre-humanos dos professores das classes regulares. Também implantada em nosso governo está a Escola Ambiental, conhecida mundialmente pela proposta de ser um centro de pesquisas e formação de educadores, além de orientação ambiental a estudantes. 

Ainda no terreno da inovação, concretizamos o Cempre (Centro Municipal de Programas Educacionais) Ruth Cardoso com o objetivo de estruturar a rede municipal para a implantação do período integral nas escolas. A medida foi efetivada pelo nosso sucessor, Marco Bertaiolli, que já contemplou aproximadamente 50% da rede escolar. 

Trago aqui o justo reconhecimento à professora Maria Geny Borges Ávila Horle, secretária municipal de Educação ao longo dos oito anos em que governamos Mogi. Ela constituiu uma fabulosa equipe que, até hoje, dá o diferencial positivo ao ensino municipal. 

É evidente que não se pode contentar a todos. E nem garantir remuneração à altura do valor de um professor. Mas, nos esforçamos para chegar ao limite do que os cofres municipais nos permitiram fazer. Tanto é que, em dois mandatos seguidos como prefeito, nunca sofremos movimentos de greve ou descontentamento coletivo por parte dos profissionais da Educação da rede municipal. Portanto, é possível ajudar a mudar a realidade do ensino público. Basta querer. Não apenas para honrar os professores, mas também para viabilizar a evolução da sociedade brasileira. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)